sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

O chiado da rede. Uma história de futebol.

Não sei, só sei que foi assim! (Em: O Auto da Compadecida)... Frase de Ariano Suassuna.

Quem jogou pelada já pegou cada tipo de campo, essa é uma dessas histórias!

Quando tínhamos em torno de 17 anos a turma da rua e do Colégio Frei Caetano montou um time para jogar peladas.

Certa vez Adeildo, penso que foi ele, marcou conosco um jogo na Barra do Brejo.

A Barra é um povoado que fica na beira de um rio, cujas margens são escarpadas na rocha, a sua faixa de terra mais plana e estreita é toda ocupada com a praça, a igreja e o pequeno comércio, mais casas. O resto sobe a ladeira.

Aí nosso time chegou e foi procurar Adeildo e a gente sequer cogitou saber qual o local do campo.

Não lembro que hora começou o jogo, mas foi cedo, só na luz natural.

Depois de uns minutos ele saiu com seu Fusca, zero, 77, com um som roadstar, fitas cassetes da melhor qualidade, a TDK, e  um dos sucessos do momento: Agepê.

Era o homem subindo a ladeira na primeira e nós atrás nos carros dos nossos pais.

Com os motores fracos daquela época era um piado só subindo a ladeira íngreme.

Acho que após, sei lá, 10 minutos, ele dirigiu o carro para debaixo de uma árvore e elevou  o som do Fusca.

Nós estacionamos por perto e fomos fazer o "reconhecimento do capim". Literalmente era um cercado formado de um capim baixo para gado. 

Eu lembro que cheguei perto do gol, pequeno, para um campo que pretendia ser do tamanho "oficial".A gente começou caminhar nele, era tão plano que parecia um tobogã.

Andamos alguns metros, ficamos observando o campo no que parecia ser o grande círculo. Visualizamos o gol do lado de baixo e logo fomos chamados para nos arrumar.

O outro time já tinha subido a ladeira pronto.

Não recordo a cor da camisa do time da Barra, não sei se era tricolor, rubro-negra, eu sei que a nossa era uma camisa Hering branca, improvisada de padrão de time de futebol, com os números pintados nas costas por serigrafista. É tudo que eu lembro.

Começamos o jogo defendendo a barra de cima.

Aí começou o segundo tempo, em uma espirrada de um zagueiro do glorioso Barra do Brejo, nós achamos um gol em um escanteio.

Atacar ladeira acima era muito melhor, a bola ficava quase colada nos pés, mas defender ladeira abaixo era uma desgraça, a bola teimava em não ir para o ataque. E o jogo correu assim por muito tempo. Só para vocês terem uma ideia.

Da barra de cima para a de baixo devia ter um declive de 30°. Mas no meio do campo tinha muitas barrocas, fruto das destocas. O cara vinha correndo e de repente faltava chão, a perna dobrava, ou a gente rolava ou caia de joelhos.

Bem, o campo vinha descendo e quando chegava perto do gol do lado de baixo ele subia como em uma lombada, depois, ainda mais abaixo ficava a barra.

O nosso goleiro era o Arthur, que costumava jogar bem. Mas o jogo era tão ruim, se não fosse o gol achado, os times iriam jogar cem anos sem nem chutar direito.

Mas de repente um cara do Barra do Brejo saiu correndo sozinho no meio campo e sobe aquele morrinho e chuta.

Mas a bola subiu, subiuuu, subiuuuu, ganhou altura e nós da defesa paramos, já esperando os meninos que estavam atrás do gol irem pegar a bola.

Nesse ínterim Arthur deu alguns passos e parou e ficou quieto, com a mesma confiança que nós: tiro de meta.

Mas de repente ele se virou para trás, colocou a mão no queixo e disse: foi gol!
Gol como Arthur? Não sei, foi gol. Gol!

Ali mesmo fizemos uma conferência: E como você descobriu que foi gol? Como eu descobri? Eu ouvi o chiado da rede. Chiado da rede? Sim, eu ouvi o som chiiiiiii, aí me virei.

Mas não era para ser gol Arthur, uma bola dessas! Mas foi. 

Aí alguém gritou, olhem a barra! Nós olhamos e balançamos os ombros, como se dissesse e daí? Olhem a barra, a pessoa insistiu e aí nós vimos.

Primeiro ela ficava mais abaixo do morrão artilheiro e depois ela parecia um cesto, um jacaré em pé com a boca aberta.

A barra tinha uma inclinação para trás que aumentava o ângulo quando a bola vinha do alto e quando o cara chutou ela disse para a bola venha cá minha menina e a abraçou.

Pronto! 1 x 1.

Aí me lembrei de Jackson do Pandeiro: Esse jogo não pode ser um a um .... Era para ser mesmo zero a zero.

Abraço e ótimo carnaval.
Marconi Urquiza

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