Um amigo passou para mim uma ideia de uma crônica. Pensar, estudar e escrever sobre mendigo de Brasília que levou uma surra do personal trainer e sua súbita condição de estrela das mídias em geral. Em poucos dias estava sendo "condenado" por suas palavras. Em um átimo de tempo deixou de ser vítima para virar algoz.
Pode? Pode um negócios desses? Pode, o mundo é uma construção incessante de narrativas e não de verdades, de uma incessante organização mediática que busca convencer e de solidificar as suas "verdades" nas almas convertidas.
Tudo isso é um fogo fátuo a queimar as pessoas e a fazer outras tantas pularem ao sabor dos aspectos ruins da vida humana. Notícia ruim dá mídia, é a que vende mais. Somos atraídos pela desgraça.
Mais que isso, não tenho como me aprofundar neste tema sem uma pesquisa cuidadosa e uma reflexão ponderada, o que leva tempo.
Além disso, ando buscando, nessa quadra da vida, pensar em pontos mais amenos, embora isto revele a minha contradição após ter escritos romances, cujo enfoque das narrativas passe pelos aspectos ruins, regulares e recorrentes das pessoas: a maldade, a violência e a luta para não sucumbir.
Pois bem, ontem viajei para participar, no futebol, dos jogos de aposentados do Banco do Brasil, em Santa Catarina. A preparação me motivou a trazer algumas recordações.
Dias desses cheguei em um treino e, naquele papo antes de iniciar, disse a alguns amigos que estava com vontade de jogar. Sabe quanto isto ocorreu? Tem mais de 15 anos. Fiquei sem jogar uma pelada mais de 10 anos. Depois desse tempo, como forma de me solicializar, tentei jogar, machuquei-me muitas vezes, aumentando a desmotivação e só insisti por que gosto de conversar com os amigos, daquele papo que torna leve a alma. Energisa.
Nessa vibe, ontem acordei passeando pela minha meninice, sentindo aquela energia que me movia o dia inteiro para ir treinar à tarde. Era descobrindo o mundo e descobrindo o futebol, aprendendo como jogar e acertando na posição, na técnica e no modo de jogar. Isso tudo me fazia feliz. Leve.
É essa leveza que tenho neste momento, ligando 40 anos de vida, nos quais 25 jogando futebol com gosto, com fome, fome que não saciava. De me enfeitar por que adorava jogar todo arrumado. Tenho até uma história que ilustra isso.
Um dia estava em Manaus e vi uma camisa do São Paulo, Adidas, aquela branca, número 10 nas costas, na frente de uma loja de rua. Na época o time jogava o fino e nem tinha sido Campeão do Mundo. Jogava bonito, encantava. Aquela camisa me chamou, a comprei.
Então aos sábados a vestia, colocava meião de marca, calção também, caneleira e tornozeleira, imitando Dr. Sócrates, por cima do meião. Nesse tempo inventei um uniforme para o São Paulo com ele jogava a minha pelada. A camisa branca, o calção e os meiões eram vermelhos. Camisa ensacada no calção, meião ia até perto do joelho. Chuteira, preta, engraxada. Pronto, lá ia eu brincar de jogador profissional. Me sentia feliz. Mas um dia, ao chegar na pelada, alguém me perguntou por que eu estava tão enfeitado, na verdade ele disse: Pra que isso? Não pensei estar chamando à atenção e estava. Não lembro se disse: Por que gosto ou Por que me sinto bonito.
Era assim mesmo, eu me sentia bonito jogando todo arrumado, parecendo que iria para uma festa de formatura, pois é, pois é assim que me sinto nessa viagem, como aquele menino de 28 anos, todo enfeitado, vestindo um uniforme de futebol completo, como um traje de gala. O meu esporte fino. E viva o Grande Ariano Suassuna!
Abraço, Marconi Urquiza
