Chuteira Olé, a top daquele interior. Naquela pelada, domingueira, entrou de lateral direito, no gol do outro time, Geo, o melhor goleiro da década de 1960 em Bom Conselho.
A pelada, como quase todas, começou organizada. Cada jogador guardando a sua posição. Na medida que foram cansando o lateral-direito foi ousando, saindo da linha lateral, não sabe como o meio do campo se abriu, como se Moisés tivesse feito a sua mágica e bola caiu na sua frente... Empurrou a bola e saiu correndo...
Um dia, alguns anos antes, ganhou a primeira camisa oficial do Sport Recife, usou até furar, e aquela chuteira Olé, aquela da pelada, comprada à prestação em uma sapataria de Garanhuns, só parou de jogar com ela quando perdeu metade das travas.
Era a tríade dos seus desejos de menino. Bola de couro, chuteira e não Kichute, Calção Adidas que começava a aparecer por lá.
Lembra a bola que caiu na sua frente, no meio do campo arenoso, ele saiu acelerando as passadas, foi chegando na cara do gol e o goleiro Geo foi crescendo na sua frente, ficando maior que seu 1,83.
Acelerado, o lateral fez o que um peladeiro tenta, chutar forte, mas a bola espirra, saiu meio de ponta de pé, fraca.
A bola escapuliu do seu pé sem querer chegar, passou a cinco dedos do pé esquerdo do goleiro e o rapaz virou o rosto para ver onde a bola ia e cinco metros depois ela quicou na linha do gol, mais alta que o nível do campo, e subiu, subiu, subiu e foi se deitar na rede "véu de noiva", escorregando lentamente dentro do gol e lá rebolou, deu algumas voltas sobre o seu próprio eixo, até cochilar.
Eu abri um sorriso imenso, só não gritei com esse gol por timidez, deveria ter feito. Nunca tinha feito um em uma barra com rede.
Esse primeiro gol, em um domingo de céu azul, com brisa suave que vinha da serra de Santa Teresinha lambendo o rosto, tudo aquilo me encantou.
Passados 46 anos daquela pelada, me vejo tentando jogar algumas peladas e os joelhos reclamando muito. "Calma amigo, eu vou de leve", é só o que posso dizer e continuar buscando no reforço muscular a satisfação de um passe bem feito e um chute bem colocado.
Estou em Balneário Camburiú, movido pelo presente, nos jogos de integração dos aposentados do Banco do Brasil.
E não é algum gol magistral, algum craque da maturidade, não é a organização, são as pessoas, elas que fazem a festa. Que trazem força e calor, e animam a teimar até a próxima jornada esportiva.
Abração,
Marconi Urquiza