sexta-feira, 3 de março de 2017

Você é banal?

Nada é mais prejudicial ao pensamento próprio do que uma influência muito forte de pensamentos alheios.... Frase de Arthur Schopenhauer.

Você já parou para refletir como as atitudes não éticas, como sonegar informações ao cliente ou o induzir a comprar um produto ou serviço para cumprir uma meta ser tão comum que parecem normais a muitos profissionais?

Hannah Arendt ao analisar o nazista Adolf Eichmann disse que em sua defesa que "estava apenas cumprindo ordens", semelhante as declarações de outros líderes nazistas no Julgamento de Nüremberg.

Ele "se lembrava perfeitamente de que só ficava com a consciência pesada quando não fazia aquilo que lhe ordenavam - mandar milhões de homens, mulheres e crianças a morte, com aplicação e o mais meticuloso cuidado (p.37)".

Você conhece alguém com esse perfil?

Segundo Phil Zimbardo (p. 404) Arendt se surpreendeu integralmente ao dizer que Eichmann parecia absolutamente comum:


"Meia dúzia de psiquiatras havia atestado a sua 'normalidade' - 'Ele é, pelo menos, mais normal do que eu fiquei depois de examiná-lo', teria exclamado um deles, enquanto outros consideraram seu perfil psicológico, sua atitude quanto à esposa e aos filhos, mãe e pai, irmãs e amigos, 'não apenas normal, mas inteiramente desejável (p.37)".

Você já conviveu com alguém assim, ser um amor de pessoa até receber ordens e se transformar em um dedicado e maldoso cumpridor das metas?

Então Arendt nos trouxe uma grande lição:


O problema com Eichmann era exatamente que muitos eram como ele, e muitos não eram pervertidos, nem sádicos, mas eram e ainda são terrível e assustadoramente normais. Do ponto de vista de nossas instituições legais e nossos padrões morais de julgamento, essa normalidade era muito mais apavorante do que todas as atrocidades juntas, pois implicava que [...] esse era um tipo de novo criminoso [...] que comete seus crimes em circunstâncias que tornam praticamente impossível para ele saber ou sentir que está agindo de modo errado (p.299). Foi como se naqueles últimos minutos [da vida de Eichmann] estivesse resumindo a lição que este curso da maldade humana nos ensinou - a lição da terrível banalidade do mal, que desafia as palavras e os pensamentos (p.274).


Para Phil Zimbardo, Arendt foi a primeira a negar a orientação que a maldade vem dos traços de loucura dos malfeitores e a violência despropositada dos tiranos como traços constitutivos de seu modo de ser pessoal. Ela observou que isso muitas vezes decorre da fluidez com a qual as forças sociais podem levar pessoas normais a realizarem atos terríveis (p. 405) e menos terríveis, mas atos no mínimo não éticos.

Aqui fica um alerta, dita por C. S. Lewis:


[...] que uma poderosa força de transformar o comportamento humano, empurrando pessoas para além dos limites entre o bem e o mal, advém do desejo básico de estar 'dentro' e não 'fora" e segundo isso nos arma uma armadilha que quebra os freios da moralidade e da ética para ser aceitos em um 'Círculo Interno', pois segundo ele 'um palpite virá. [...] Será o palpite de algo, que não está bem de acordo com as regras técnicas do jogo honesto, algo que o público, o ignorante e romântico público, jamais compreenderia. Algo ante o qual até os de fora da própria profissão estariam propensos a fazer um rebuliço, mas é algo, diz seu novo amigo, que 'nós' - e com a palavra 'nós' você tenta não corar de puro prazer -, algo que sempre fazemos. (Zimbardo, 2007, p. 365)

Aqui fica o meu próprio alerta: esteja sempre, sempre, sempre atenta, sempre atento ao canto da sereia.

Abraço e ótimo final de semana,
Marconi Urquiza

Referências:
    

Links:
http://www.prisonexp.org/book/
http://www.socialpsychology.org/




sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

O chiado da rede. Uma história de futebol.

Não sei, só sei que foi assim! (Em: O Auto da Compadecida)... Frase de Ariano Suassuna.

Quem jogou pelada já pegou cada tipo de campo, essa é uma dessas histórias!

Quando tínhamos em torno de 17 anos a turma da rua e do Colégio Frei Caetano montou um time para jogar peladas.

Certa vez Adeildo, penso que foi ele, marcou conosco um jogo na Barra do Brejo.

A Barra é um povoado que fica na beira de um rio, cujas margens são escarpadas na rocha, a sua faixa de terra mais plana e estreita é toda ocupada com a praça, a igreja e o pequeno comércio, mais casas. O resto sobe a ladeira.

Aí nosso time chegou e foi procurar Adeildo e a gente sequer cogitou saber qual o local do campo.

Não lembro que hora começou o jogo, mas foi cedo, só na luz natural.

Depois de uns minutos ele saiu com seu Fusca, zero, 77, com um som roadstar, fitas cassetes da melhor qualidade, a TDK, e  um dos sucessos do momento: Agepê.

Era o homem subindo a ladeira na primeira e nós atrás nos carros dos nossos pais.

Com os motores fracos daquela época era um piado só subindo a ladeira íngreme.

Acho que após, sei lá, 10 minutos, ele dirigiu o carro para debaixo de uma árvore e elevou  o som do Fusca.

Nós estacionamos por perto e fomos fazer o "reconhecimento do capim". Literalmente era um cercado formado de um capim baixo para gado. 

Eu lembro que cheguei perto do gol, pequeno, para um campo que pretendia ser do tamanho "oficial".A gente começou caminhar nele, era tão plano que parecia um tobogã.

Andamos alguns metros, ficamos observando o campo no que parecia ser o grande círculo. Visualizamos o gol do lado de baixo e logo fomos chamados para nos arrumar.

O outro time já tinha subido a ladeira pronto.

Não recordo a cor da camisa do time da Barra, não sei se era tricolor, rubro-negra, eu sei que a nossa era uma camisa Hering branca, improvisada de padrão de time de futebol, com os números pintados nas costas por serigrafista. É tudo que eu lembro.

Começamos o jogo defendendo a barra de cima.

Aí começou o segundo tempo, em uma espirrada de um zagueiro do glorioso Barra do Brejo, nós achamos um gol em um escanteio.

Atacar ladeira acima era muito melhor, a bola ficava quase colada nos pés, mas defender ladeira abaixo era uma desgraça, a bola teimava em não ir para o ataque. E o jogo correu assim por muito tempo. Só para vocês terem uma ideia.

Da barra de cima para a de baixo devia ter um declive de 30°. Mas no meio do campo tinha muitas barrocas, fruto das destocas. O cara vinha correndo e de repente faltava chão, a perna dobrava, ou a gente rolava ou caia de joelhos.

Bem, o campo vinha descendo e quando chegava perto do gol do lado de baixo ele subia como em uma lombada, depois, ainda mais abaixo ficava a barra.

O nosso goleiro era o Arthur, que costumava jogar bem. Mas o jogo era tão ruim, se não fosse o gol achado, os times iriam jogar cem anos sem nem chutar direito.

Mas de repente um cara do Barra do Brejo saiu correndo sozinho no meio campo e sobe aquele morrinho e chuta.

Mas a bola subiu, subiuuu, subiuuuu, ganhou altura e nós da defesa paramos, já esperando os meninos que estavam atrás do gol irem pegar a bola.

Nesse ínterim Arthur deu alguns passos e parou e ficou quieto, com a mesma confiança que nós: tiro de meta.

Mas de repente ele se virou para trás, colocou a mão no queixo e disse: foi gol!
Gol como Arthur? Não sei, foi gol. Gol!

Ali mesmo fizemos uma conferência: E como você descobriu que foi gol? Como eu descobri? Eu ouvi o chiado da rede. Chiado da rede? Sim, eu ouvi o som chiiiiiii, aí me virei.

Mas não era para ser gol Arthur, uma bola dessas! Mas foi. 

Aí alguém gritou, olhem a barra! Nós olhamos e balançamos os ombros, como se dissesse e daí? Olhem a barra, a pessoa insistiu e aí nós vimos.

Primeiro ela ficava mais abaixo do morrão artilheiro e depois ela parecia um cesto, um jacaré em pé com a boca aberta.

A barra tinha uma inclinação para trás que aumentava o ângulo quando a bola vinha do alto e quando o cara chutou ela disse para a bola venha cá minha menina e a abraçou.

Pronto! 1 x 1.

Aí me lembrei de Jackson do Pandeiro: Esse jogo não pode ser um a um .... Era para ser mesmo zero a zero.

Abraço e ótimo carnaval.
Marconi Urquiza

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Os bichos de BC, outros apelidos e Zé Mole.

Lá na minha infância tinha uns amigos de papai com alguns apelidos derivados de outros animais,  a começar por ele.

Dr. Gia (rã grande), era o meu pai. Gordo e dono de uma farmácia, da turma dele tinha Pavão. Homem vaidoso, bem apessoado, de origem humilde e bem casado.

Outro grande amigo de papai era o Bicho Velho, Zé Bicho Velho. Homem magro, alto e com a cara de velho desde de novo.

Naqueles tempos tinha ainda o Barrão, machante, como era chamado os açougueiros por lá. Trabalhava no mercado da carne, sujeito gordíssimo, que suava às bicas, tanto que a sua pele parecia eternamente brilhosa.

Havia até um primo do meu pai, chamado de Bode Velho, pois sua voz era extremamente grave, tanto o timbre da voz quanto seu rosto carcomido pelo tempo lembravam um bode berrando.

Mas protagonizei um caso cabuloso quando soube a história de Zé Mole, sabe aquele negócio de politicamente incorreto e incrivelmente inconveniente? Foi o que ocorreu!

Zé Mole era freguês da farmácia do meu pai e ex-inspetor de quarteirão. Na época já era bem idoso, eu o atendia e tinha a curiosidade de conversar com ele. 

Freguês habitual e pontual no pagamento, ele chegava falando alto no final das sextas-feiras, fazia as suas compras e se mandava, mas deixava um rastro de sua irritação congênita. Falava tão abusado que ninguém queira atendê-lo.

Mas calhou que minha curiosidade foi maior que a prudência, pois já fazia um tempo que havia ouvido a história que originou o seu apelido.

Disse papai que ele estava em uma festa quando foi chamado para dá jeito em homem que fazia arruaças. Zé Mole chegou no cara e foi usar a sua autoridade e deu voz de prisão, mas foi surpreendido.

Quando ouvi isso de papai e sua recomendação para não falar com ele do assunto eu me calei durante meses, até que não consegui me aguentar e parti para comprovar a história, o  porquê o chamavam de Zé Mole e na lata eu perguntei a ele, que me olhou atravessado e eu insisti:

"Ou Zé Mole" - olhe a intimidade para um homem de 80 anos, eu que tinha 17 anos. "Ou Zé Mole é verdade que você foi dá ordem de prisão a um bêbado e ele sapecou-lhe um tapa no pé da orelha e você caiu e ao levantar disse teje solto?"

Eu havia todo tempo repetido e rido  ao lembrar dele: "Teje preso! Teje solto! Teje preso! Teje solto!"

Mas o seu olhar atravessado mudou para um olhar de raiva, fechou a cara, empurrou os remédios em minha direção e saiu da farmácia batendo a bengala com força para nunca mais voltar. 

Sabe aquele negócio de ficar com a boca fechada que não engole mosquito?

Pois é, eu faltei a aula de Einstein!

Se A é o sucesso, então A é igual a X mais Y mais Z. O trabalho é X; Y é o lazer; e Z é manter a boca fechada.... Frase de Albert Einstein.




OS SAQUES NO ESPÍRITO SANTO

       

        Anteontem no Linkedin Gilliard Leal postou uma foto e seu comentário de um saque em uma loja da Ricardo Eletro e aí se instalou uma longa discussão, com muitas postagens sensatas, outras emocionais, radicais, com acertos e exageros.

      O episódio lembra o caso de Abreu e Lima, inclusive no arrependimento dos envolvidos.

      Nas postagens apareceu falta de caráter, culpa do povo que vota em políticos corruptos, da cultura brasileira de levar vantagem e se aproveitar das oportunidades, mesmo que elas sejam ilegais, como no caso dos saques; até isenção da responsabilidade dos nossos líderes para a influência na cultura brasileiro de levar vantagem em tudo.

      Fiz alguns comentários, com base em dois livros, um que li e outro que estou lendo: Tolerância Zero e O Efeito Lúcifer. Também aproveitei uma citação de um comentário e lembrei de outro livro que li quando fazia o mestrado e tentava encontrar um estudo científico que me ajudasse entender alguns comportamentos no trabalho: Teoria das Janelas Quebradas.

     Todos os livros de alguma forma se relacionam com a psicologia social e sociologia comportamental, assuntos pelos quais sou fascinado. Gosto de entender os comportamentos macro, aquela coisa que nos envolve e muitas vezes só nos damos conta do que fizemos quando a merda já fedeu.

      Não me aprofundando no aspecto da individualidade, estes saques não foram motivados pela necessidade, alguns de má índole iniciam os saques, a maioria (com as suas responsabilidades individuais) entram neles pelo Efeito Manada e só depois é que se dão conta do que fizeram, o que provocou, em ambos os exemplos, a devolução das mercadorias.

      Estes fatos e os estudos citados revelam como somos suscetíveis às influências das circunstâncias, como as situações nos impelem a agir para o bem ou para o mal.

    Inclui o link para quem desejar conhecer a polêmica.

Ótimo final de semana.
Marconi Urquiza

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Cheiros

   

C H E I R O S 

Cheiro de fumaça de café quente,
Cheiro de pão fresquinho,
Cheiros que estão na alma da gente.

Cheiros...
Do leite tirado na hora.
Cheiro do gado no curral.

Cheiro de infância... 
Cheiro da chuva molhando a terra. 
Eu-menina sorrindo na enxurrada.

- Às vezes o dia tem cheiros de ontem! 

®Verluci Almeida
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Amiga leitora, amigo leitor, em algum momento você parou para pensar nos cheiros dos seus lares?

Dois, três, talvez entre quatro e cinco anos eu escrevi uma crônica intitulada de Sons e tive do amigo Djalma Xavier a mais bela resposta a uma crônica minha, dele veio o belo libelo à sua família ao dizer sobre os cheiros da sua casa materna,  do cheiro do amor do seu lar em Pesqueira.

Todo lar tem seus cheiros, o cheiro da cozinha, dos quartos, das roupas, cheiro das pessoas e nos mais antigos vai aparecer até cheiro de lenha queimada.

Mas cheiro do amor, tão claramente declarado, tão amorosamente dito por Djalma e depois de ter passado tanto tempo parece não ser a regra comum.

Da família parece mais comum na idade adulta falar das carências, falar das mágoas, dos sacrifícios materiais e por aí vai, mas de amor?

Bem! De amor é mais escasso, por isso é uma joia rara e por isso é que enalteço OS CHEIROS LÁ DE PESQUEIRA.

      Um Cheiro meu povo!

Um grande abraço e ótimo final de semana,
Marconi Urquiza

domingo, 22 de janeiro de 2017

Agenda da Ausência.

              Quem está ausente, teme e tem todos os males.... Frase de Miguel de Cervantes.    
   Quando ouvi do professor da disciplina de Políticas Públicas no mestrado de Gestão Pública dizer que só vai para a agenda dos governantes quando o problema pode lhe condenar perante a opinião pública eu fiquei sem entender claramente o seu raciocínio: É só assim que há as ações de governo? Então depois comecei a prestar atenção nas situações que provocavam coletivas à imprensa ou os comunicados formais.

     Por causa dos problemas recentes nos presídios eu tenho lido muitas opiniões pelo fato de que eles viraram território das facções, o estado faz que manda e os internos fazem que são mandados.

     Por causa de tais problemas veio o dilema político-legal: deixa os caras se matarem ou intervem gastando uma fortuna?

     Mas aí surgiu a opinião internacional e as piores comparações contra o Brasil forçando o governo a agir, pelo menos na comunicação.

    A questão maior é que os problemas internos nos presídios tem um perna musculosa fora deles, são milhares de agentes anônimos dispostos a agirem em nome da chefia das facções, até já estão se infiltrando nos órgãos do Estado e isso é um problema muito mais grave e que vem sendo reanotados na agenda pública a cada crise e há muito tempo.

    Alguns dos colunistas que li nos jornais, blogs e sites de notícia, como é também da opinião de alguns estudiosos da segurança pública é que o Brasil pode estar entrando na mesma rota da perturbação da ordem institucional que ocorreu na Colômbia  dos anos oitenta e noventa, cujo maior expoente foi o narcotraficante Pablo Escobar, o que por si não exige maiores explicações.

    Se tal realidade estiver mesmo ocorrendo e não for combatida com uma Politica de Estado, de longo prazo e que ultrapassa governos, correremos o risco de vivenciarmos anos de muita agonia.

Abraços e bom final de semana.

Marconi Urquiza



sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Modas de Menino

        Cada qual sabe amar a seu modo; o modo, pouco importa; o essencial é que saiba amar.... Frase de Machado de Assis.
         
   Saí dos 57 anos e viajei para os 17, onde meus olhares de curiosidade, mais que de cobiça se voltavam para as meninas.
    
      Eram seres estranhos, todo um continente a ser descoberto e se me perguntar: Descobriu? Amei, mas estou ainda tentando descobrir.
     
      É um universo enorme. Não vou descobrir.
    
     Mas essa viagem para os 17 anos começou na sexta passada em BC, minha terra natal e da minha adolescência.
     
     Passou uma jovem com seus quadris levemente pronunciados, nem retos e nem em excesso, mas com um caminhar que os fazia erguer ritmados, em um requebrado tão natural quanto gracioso.
   
     E o que fez enaltecer esse seu atributo natural foi a roupa, estava vestida em uma calça leve e flexível e não nas habituais armaduras, apertadas, que chamamos de jeans.

     Na hora eu fiz uma analogia nada graciosa, comparei os quadris subindo e descendo a duas cartucheiras do velho oeste, cheias de brilho e de balas.

     Aí foi quando voltei aos 17 anos, curioso e doido para sentir o cheiro e o gosto da pele daquelas meninas que rodavam na Praça Pedro II e sem compreender, patavinas, do coração de uma mulher.

Abraço e bom final de semana.
Marconi Urquiza

BC - Bom Conselho (PE)

O poder revela ou transforma uma pessoa?

  imagem: Orlando/UOL.            Um papo na última segunda-feira entre aposentados do Banco do Brasil que tiveram poder concedido pela empr...