sexta-feira, 5 de junho de 2020

Perto da alegria

Um casal de ferias

O mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar. 
O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. 
O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar. 
                                                            Carlos Drummond de Andrade


Aqui da varanda de casa olho o mundo, o mundo empatado pelos prédios que cercam o meu apartamento. As janelas estão vazias, um, outro, raros moradores chegam e também olham o mundo, apenas alguns segundos, logo voltam. Vêem menos do que eu, não contemplam o que enxergam.

Ouço no streaming uma canção de Chico Buarque, agora um clássico cubano embala os meus ouvidos, não gostei, apertei uma tecla e entrou outra música. Deixei ela embalar até a metade, busquei uma canção que o meu espírito aprove e me deixe contente, perto da alegria e longe da tristeza.

Oitenta dias de quarentena. Levanto a cabeça e fico olhando ao redor, sem procurar nada e tudo, desejando não me entediar, por isso passeio com olhar. O sol a pino deixa as cores vivas, bonitas, não faz calor na varanda. O sol está nas costas do prédio. Olho a taça de cerveja, está quase no final, daqui a pouco irei abrir outra minicerveja.

Os meus olhos voltam a passear de novo pelos prédios, esbarro durante poucos segundos, vejo uma pessoa, em um apartamento alto, bater um tecido na janela, jogando pó ao vento, que irá longe, o vento sopra suave.

Continuei sentado e passeando pela vizinhança, com aquela preguiça de quem vê a mesma coisa toda vez que olha no horizonte, aí o meu olhar esbarrou em uma janela, vi alguém como se estivesse bailando, agucei o olhar e vi uma mamãe embalando o seu bebê ao som daquela música, que só está no seu coração.

                                           O amor é grande e cabe no bailar de um ninar
هو هبه بين يدي (com imagens) | Arte de mãe, Pintura bebê, Mãe e ...
(Recife, domingo. 31 de maio de 2020. Entre às onze horas e o meio-dia)


Abração, semana iluminada.

Marconi Urquiza

4 comentários:

  1. Fazer crônica do cotidiano é ter percepção alargada pela sensibilidade. Parabéns.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Desculpe, falhou a minha resposta pelo celular, ainda bem, me deu oportunidade de escrever outra coisa.

      Não de repente, mas a mesmice da quarentena, a cobertura da Covid-19 e da política brasileira, traz uma mesmice perigoso, a da acomodação. Como escrevi a crônica no momento em que vi a cena final, penso que peguei no "ar" o meu sentimento de "espanto". Em geral eu mato tais inspirações, não anoto, tento jogar na memória, mas ele foge e o texto ao escrever depois perde a emoção.

      Dois dias depois a publicar veja uma postagem no Facebook (Penso de Norma Lúcia) com uma atriz lendo um texto de Rubem Alves: A COMPLICADA ARTE DE VER.

      Sabe, aí eu pensei: Parece que achei um caminho para as minhas crônicas. Já vou adiantar o título da próxima: Passarinho tomando sol.

      Excluir
  2. No meio do caos que a nossa vida se tornou do dia para a noite, o embalar de uma mãe nos lembra que tudo passa. Que texto bonito para amenizar esse momento.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Desculpe Ana, falhou a minha resposta pelo celular. Penso que só escrevi este texto por que escrevei a primeira versão tão logo vi a cena. Ali no ato, no verso de uma página em branco, de um texto que eu revisava, eu escrevi. Creio que por isso pude pegar a emoção e o sentimento daqueles instantes.

      Dois dias depois a publicar veja uma postagem no Facebook lendo um texto de Rubem Alves: A COMPLICADA ARTE DE VER.

      Sabe, aí eu pensei: Parece que achei um caminho para as minhas crônicas. Já vou adiantar o título da próxima: Passarinho tomando sol.

      Abração.

      Excluir

Deixe seu comentário.

O poder revela ou transforma uma pessoa?

  imagem: Orlando/UOL.            Um papo na última segunda-feira entre aposentados do Banco do Brasil que tiveram poder concedido pela empr...