sexta-feira, 26 de julho de 2024

Meu emprego devo às folhas

        
Fonte (*)

        Na quarta-feira voltava da academia perto das oito horas da manhã e vinha concentrado na próxima esquina, de parar no semáforo, depois no outro e que este caminho é o mais seguro para voltar para casa.

        No lado esquerdo da Avenida Rosa, quase em frente ao empresarial ETC, fica a FUNASA - Fundação Nacional de Saúde, que duas entradas, uma na Rua do Futura, outra nesta avenida. Nesta entrada há algumas árvores que despejam diariamente suas folhas na calçada. 

        Lembro vivamente como ali era feio, com jeito de abandono.  Sujo. Mato crescende nas frestas da calçada do estacionamento, que não é utilizado. Frutos que caem e ficavam por ali apodrecendo. 

        Então, virei a Dr. Malaquias e entrei na Rosa e Silva, toco as passadas firmes, mas não avexadas. Eram firmes, sem pressa. Pela cabeça também passava a agenda do serviço da nanoempresa que toco há três anos, pensava na capa do romance O Último Café do Coronel, que parece que entrou em looping e eu não me decido escolher uma, entre outras coisas a me preocupar.

        Aquele rapaz seria um ser que sequer guardaria em algum resíduo de memória.  Meus pensamentos eram tão dominadores que ele não receberia o bom dia que costuma dar a quem me dar atenção. 

        Mas ele interrompeu as minhas divagações e sorrindo disse: "Essas folhas, olha essas folhas, a elas devo o meu emprego". Fui surpreendido e não respondi à altura daquele pedido direto de atenção, ele percebeu o meu estado, deu um sorriso, que me pareceu revelar a enorme angústia que sentia quando desempregado, deu seu sorriso aberto e já estava de costas para mim trabalhando.

        Andei mais sete, oito minutos pensando no rapaz. Metade do tempo me preocupando em não ser atropelado. Mas ao chegar em casa ele já era um traço na memória. 

        Assim fiquei quase todo o dia, foi quando a lembrança dele voltou e eu comecei a pensar:
— Quanto tempo ele ficou desempregado?
— Quais dificuldades passou para ser tão grato àquelas folhas?
— Será que ele pensou em tratar bem a natureza antes?
— Será que elevou o pensamento em gratidão?
— O que ele fará quando se sentir entediado em varrer as calçadas, o enorme pátio, em uma repetição quase insana da mesma coisa todo santo dia?

        Não saberei nunca as respostas destas indagações e nem sobre ele. Mas sinceramente torço que perdure no emprego e nele seja feliz.

        Sabe, fiquei tão surpreso em ser escolhido para ouvi-lo, era como se fosse um desabafo.  Poderia ser qualquer pessoa, mas ocorreu comigo. Fui eu que que vi seu sorriso de alívio por aquelas centenas de folhas caírem para ele varrer.

        Com atraso, por hoje é só.

        Abração, Marconi Urquiza


Observação:
— Fonte da imagem que ilustra a crônica:

sexta-feira, 5 de julho de 2024

Não era mentira e nem era verdade

     
Foto extraída do Facebook

Inspirado no meu próximo romance: 
"O Último Café do Coronel."

            Começou a pesquisar, querer saber das pessoas contemporâneas daqueles fatos. Mas o desejo veio de muito tempo atrás, de uma frase que serviu de consolo:
        "E os meus eleitores? Não posso abandonar."

        Isto acalentava uma alma sofrida. Revelava uma decisão valorosa. Dava uma resposta para não sair.

        Vamos conversar. Vamos perguntar.  Vamos ter certeza.  Mas não havia certeza.

        Nas muitas conversas havia convergência, mas ninguém sabia o que o coração de Mário tinha e sentia. Ninguém nunca soube. Alguém sabia, sua esposa.  Quem mais?

        Nem era mentira, nem era verdade. 

        Verdade foi o que foi publicado em pequeno box do Diário de Pernambuco no dia seguinte: Candidato morto. 

        E a notícia correu pelo rádio, adiantou-se ao telefone, chocou uma cidade.

        O silêncio correu feito um rastilho. Muitos, sem tal consciência, sentiram em seus corações que a disputa passara do ponto, eliminara um ser muito querido. 

        Uma tarde, um dia inteiro, a cidade ficou sem faturar.  Fechar, fechar não foi por medo, mas por respeito. 

        "É ele! É ele...!" "É ele" da disputa entusiasmada jazia no centro da Igreja Matriz.

        Alguém por zelo ou dever profissional enfaixara as mãos despedaçadas por chumbo.

        "É ele" jazia, irremediável.  Naquela madrugada Alguém choramingava ao ver no silêncio da cidade as torres iluminadas da igreja e o corpo dormitando, quase sozinho, no meio da imensa igreja. 

        Bem, por hoje é só. 

        Abração, Marconi Urquiza 


      Mais do projeto:
        Estou preparando o livro com um carinho danado. No final do mês receberei o esboço da capa de uma designer profissional que faz este trabalho para uma das grandes editoras brasileiras, a "Todavia Livros."

        Na medida em que o projeto for avançando informei a todos.

        
        "Leia também", para saber mais:
        

sexta-feira, 21 de junho de 2024

Bastidores ou quase um Make Off

        
Uma das primeiras capas do livro. Não é a capa escolhida.


        Faz praticamente 8 semanas semanas que quebro a cabeça para organizar o lançamento do livro O Último Café do Coronel. 

        Depois de mais de cem tentativas dei por concluída a capa. Hoje tenho dúvida.

        Capa desenhada. Pera aí!

        Antes disso em dezembro passado contratei pelo Instagram uma empresa para sugerir uma capa, revisar e diagramar o livro, paguei e a empresa quebrou.  Não fez o serviço.  Tinha 90 dias para fazer. Já estava no final de abril. Por ter em mente uma data para lançar o livro, corri. Contratei uma profissional para revisão e diagramação. 

        20 dias depois recebi a revisão. Sem combinar comigo, a revisora e copydesk mexeu na divisão do livro e nos diálogos. Não prejudicando a compreensão, mas o estilo que tenho tentado para o romance.  Refiz algumas partes e fui cuidar da diagramação, que também teve alterações sem conversar comigo. 

        Vou abrir um espaço aqui para uma percepção. Nos serviços digitais, contato apenas pelo WhatsApp, a compreensão do que o contrante deseja e quem vai executar o serviço frequentemente é ruim. São linguagem diferente, quase como um dialeto. Quem está do lado de cá não consegue expressar tudo o que deseja, quando sabe o que quer em detalhes? O mais frequente é o leigo fala de um jeito, o experto não entende, ou não explora adequadamente a mensagem recebida. Em resumo, o serviço não sai como se deseja e criam-se chateações.

        Voltando para a história, aí recebi o livro diagramado, achei que deveria ir em frente. Preparar a divulgação e o lançamento. Aqui estou nesta etapa, um quase copiar e colar em busca de ideias para divulgar o livro nas redes sociais.

        Ando consultando o que as editoras grandes fazem, rabiscando em busca de um estalo que me dê a sensação que aquele será um bom caminho. É neste momento em que me encontro.  Com o prazo que me dei para lançar correndo feito um cavalo desembestado ladeira abaixo: 13 de agosto de 2024. Já começo a sentir como "meu chefe" tivesse minuto a minuto me pressionando. "Vai meu filho!"

        Antes de encerrar, teimava em admitir que em vez de um livro, eu tinha outra coisa. Livro ao qual me dediquei 4 anos de forma intensa, e desde 2007 para quando o título do livro colou no meu coração e eu comecei a escrevê-lo. 

        Pois bem, em vez de um livro, "eu tenho um produto". PRODUTO. Pode ser que o vendo assim destrave a percepção do que fazer para conquistar leitores. Ontem meu filho Victor sugeriu, vá atrás dos influenciadores digitais para viralizar. É fazer o produto ser um viral. O LIVRO ser viral, a história viralarizar.

        Bem, vou compartilhar uma parte romance em que o coronel Jacó chegou à sua antiga casa.

        Aqui e ali levava uma delas (netas) para passear na fazenda. Mostrava os animais, os seus cavalos de raça eram a sua predileção. Nesses passeios ele dizia: “Venha menina, vem olhar e sentir o cheiro da flor de café.” Na época das floradas do café, ele dava um jeito de transformar algumas flores no perfume de Água de Colônia.

        Essas lembranças o fizeram sorrir e ele começou a se balançar na cadeira de madeira clara.


        Por hoje, é só.
        Abração, Marconi Urquiza








sexta-feira, 14 de junho de 2024

Por onde andará Formalidade?

                
Avatar criado no Bing por pedido que fiz.

           Diversas vezes vi um personagem do mundo da bola da AABB Recife ser criticado, em tom de gozação é comum se escutar: Aposto que ele nem suou a camisa. Tal é falta de empenho ou a sua forma de jogar incomoda as pessoas.

        Aí hoje estava passeando por estas e outras memórias  quando parei em um nome: Formalidade. 

        Formalidade foi o apelido que coloquei em um colega da Faculdade de Zootecnia na UFRPE. Estivemos por ali entre 1979 e 1981, quando ao final do ano saí e os rumos não mais se encontraram. 

        Lembro que ele chegava todo arrumado na sala de aula. Camisa passada, colocada dentro da calça, barba sempre feita. Todo alinhado, palavra comum na época para dizer que uma pessoa estava elegante. Destoante das roupas mais desarrumadas dos demais colegas de curso.

        Ele era assim.

        Em uma das nossas conversas no intervalo entre as aulas, ele contou que não tinha mais a mãe, morrido há alguns anos. Passou rápido uma tristeza pelo seu rosto, logo lembrou de algo que o fez serenar a expressão. 

        O papo prosseguiu e ele falou que sua família era praticamente ele e o pai, a quem ajudava, pela manhã, em um restaurante popular na rua de Santa Rita, em Recife. Na época, vizinha a Rodoviária do Recife. Outros assuntos entraram, mas ele deixou escapar que não tinham empregada e que tudo na casa era feito pelos dois. Que era preciso deixar tudo em ordem. Ali comecei a compreender um aspecto peculiar e forte nele, a organização.

        Logo no primeiro semestre tivemos a disciplina de Educação Física, e o professor foi nada menos que o árbitro que apitou o jogo do milésimo gol de Pelé: Manoel Amaro de Lima. Sujeito bonachão, mas que deu uma sova nos novinhos sem nenhum preparo físico. Era gente toda dolorida, dias a fio, eu também.

        Alguns meses depois foi lançado o campeonato interno de futebol de campo entre as turmas e cursos da UFRPE. Eu estive nele e Formalidade também no time de Zootecnia. Um time sofrível, mais lutador que técnico. Até em um jogo contra um dos times de Agronomia ganhamos por 4 x 2. Um jogo memorável. Tínhamos um jogador. Era meia, era meio volante, era meio atacante, com um gás imenso, que fez 2 gols.

        O campeonato atravessou o período das chuvas do Recife. Era muito comum jogar com o campo borrado de lama. Além de tudo isso, naquele primeiro ano, todo mundo era obrigado a jogar descalço. Aja queda, eu mesmo levantei voo quando nosso lateral escorregou e me pegou em cheio.

         Era assim, o mais limpo só tinha a cabeça sem lama, o resto, tinha alguma parte do corpo sujo, menos um jogador de nossa equipe. Era como ele não tivesse em campo, assim era o uniforme de Formalidade. Saia do campo tão limpo quanto havia entrado, ele corria soltando as poças de lama, depois corria em campo sem nem tocar na bola. 

        Na falta de jogador, todo mundo contava. Mas vamos ao apelido. Ser organizado e um tanto formal, era o perfil dele. Aí um dia a gente estava se arrumando para ir para casa após um jogo com o campo seco e eu prestava atenção em como ele tirava a roupa de sua bolsa de couro a tiracolo.  Era tudo arrumado, cada coisa em um lugar, nada deslocado, tudo bem dobrado, tudo era bem organizado, até a roupa usada. Era tão organizado que ele colocava mão na bolsa, sem olhar para dentro e tirava dela o que precisava. 

        Não sei como, de repente veio a palavra Formalidade, dali em diante ele trocou de nome entre os colegas mais próximos na faculdade. 

        Sabe aquele episódio do início, ele me fez lembrar de Formalidade nesta semana. Ao longo dos anos, vez por outra a sua lembrança vinha, exatamente por ele correr em campo saltando as poças de lama e água. O danado é que o nome de batismo teimava em ficar no anonimato e ficou assim mais de 30 anos. Até a última terça-feira.

        Pois bem, por onde andará o amigo Gilson?


        Por hora é só.  Abração,
        Marconi Urquiza. 

quinta-feira, 18 de abril de 2024

O "Desaforo" e a "Desforra" (Irã x Israel)

      


    Há 4 dias ouvia a entrevista do embaixador de Israel na Rádio CBN, logo no início, ao responder uma das perguntas ele disse que não saberia como Israel se portaria diante do ataque do Irã, que não tinha e nem teria acesso a estas decisões, depois pareceu pensar como responder e e por fim disse, mais ou menos assim:
    — Naquela região (Oriente Médio) não se pode ficar sem responder a qualquer agressão. É duro. 
    Em suma, tem que haver troco, só assim parece que há respeito.
     Horas depois refletia sobre este ponto da entrevista. Talvez seja um dilema como calibrar a resposta, onde responder, como responder, se vai ter vítimas em larga escala ou algum azarado que estará no caminho de algum drone e, ao mesmo tempo, não pode haver indecisão. Atacado em um dia, Israel atacou no dia seguinte o Hezbollah. Grupo ligado ao Irã.

    Um dano colateral menor é aceitável. 

    Estava a refletir no curso desta crônica quando viajei para um dos livros lido nos últimos meses.
    No fundo o autor faz uma alerta do perigo imenso a respeito da terra sumir. NUNCA, de Ken Follet, tem essa missão de levar os leitores a saberem que estamos literalmente pisando sobre bombas.
    O romance, cujo enredo, atravessa uma guerra local no combate a terroristas e que se espraia para uma guerra atômica.  No livro há todos os elementos dos dilemas, decisões, indecisões e uma escolha fatal por ter que responder a uma agressão, que começou pequena e que vai em um crescendo que aniquila todos na Terra.
    É o que se tem no quadro atual entre Irã e Israel, a suprema escolha impulsionada por uma cultura em que o "desaforo" se responde com a "desforra". A Lei de Talião, em resumo é o "olho por olho, dente por dente."
    Não muito diferente do Sertão Nordestino mais antigo, das brigas entre e ou internamente nas Facções, de alguns jogos de futebol, das disputas dentro das empresas e por aí vai.
    Com a realidade que se tem no Oriente Médio, uma guerra ampla é uma possibilidade tenebrosa, por que o tal de "parar por aqui" pode ser rompido por decisões políticas insanas ou por que é impossível uma decisão política apaziguadora.

     Bem, por hora é só. 

     Abração, Marconi Urquiza 

sexta-feira, 5 de abril de 2024

É sobre um fã de Gabriel Garcia Marquez

         


        Fiz algumas leituras nestas duas semanas que me deram uma certa saudade. A primeira leitura foi o romance Em Agosto nos Vemos, de Gabriel Garcia Marquez. Uma história tão curta e tão boa que fiquei com a sensação de "quero mais". Outras duas leituras foram textos em que os escritores falam de um ponto dos seus passados que os alegrou, deixou um que de saudade como o sabor da rapadura sugada lentamente.

        Terminei o livro e me pus a folhear as informações sobre a carreira de Gabo, a lista dos seus livros e fui cair em um final de semana de 1984, que por falta de grana não fui para Recife, onde todos os colegas solteiros viajaram e fiquei só todo o final de semana na república. Mas naquela sexta-feira um colega havia me enprestado Cem Anos de Solidão, leitura finda no domingo à tarde. Dois dias de leitura, sem precisa de um dicionário. Fiquei ao mesmo tempo contente e desapontado, "como é que uma família se acaba em 100 anos?".

       Alguns dias depois da leitura voltei a passear pelas páginas do Em Agosto nos Vemos e parei na página da enumeração das obras do autor. Aí fui contar. São vinte romances. Li 13. Imaginava que havia lido apenas 10 romances. São eles.

        - O amor em tempos de cólera - livro lindo sobre o amor que persiste até a velhice;

        - Cem anos de solidão - famoso;

        - Crônica de uma morte anunciada - ao ler parecia que via a um filme, tamanha a perfeitção narrativa;

        - Em agosto nos vemos - as aventuras amorosas de uma mulher na meia idade;

        - Os funerais de Mamãe Grande - li em espanhol, levei 6 meses. A maior teimosia com um romance;

          - O veneno da madrudaga (A má hora) - li, também espanhol, mais 90 dias teimando. Onde a fofoca e a mentira tira um povoado do prumo.

        Estes três romances me parecem com uma temática parecida, a velhice, a perda do poder e um certo abandono que os personagens têm quando idosos, são eles: 

        - O general em seu labirinto;

        - Ninguém escreve ao coronel e 

        - O outono do patriarca.

         Sabe, anos depois quando comecei a escrever romances, o estilo de Gabriel Garcia Marquez havia se impregnado na minha alma e eu, sem perceber, escrevia em  um estilo que se assemelhava ao dele. Não digo por mim, mas de opiniões de amigos que leram os meus romances me deram. Claro que fiquei feliz, muito feliz. E também sendo sincero, fiquei surpreso. Hoje penso que entendo, depois de ler 13 livros dele, 11 dos quais em poucos anos, alguma coisa haveria de ficar, além do enorme prazer de passear por todas as suas histórias.

         Ao ler Em Agosto nos Vemos voltei a passear pelas vidas emanadas pela maestria de Gabriel Garcia Marquez. Se não leu, escolha um, se não tem paciência para romances grandes, leia Crônica de uma morte anunciada ou Em Agosto nos vemos, se o amor lhe atrai, vá em O amor em tempo de cólera. Mas leia, o Gabo é bom demais.


        Por hoje é só. Abração.

        Marconi Urquiza

        

        Em tempo:

          Os abaixo não lembro os enredos:

        - A incrível e triste história de cândida Erêndira e sua avó desalmada;

        - Memórias de minhas putas tristes;

        - Notícias de um sequestro;

        - Do amor e outros demônios.


       

        

sexta-feira, 29 de março de 2024

"Homens em tempos sombrios" - Hannah Arendt

Ilustração criado pela IA do Bing - Microsoft

        "Homens tempos sombrios" é um livro de Hannah Arendt, filósofa, que nele traça perfis biográficos de pessoas que a fascinaram e resistiram, com capacidade crítica, aos "tempos sombrios" do século XX.

        Lembrei-me dele e principalmente de Hannah Arendt, porque li livros que escreveu onde eu buscava uma explicação "lógica" para as ações dos nazistas. Nessa busca, quase agoniada, esbarrei com dois livros que deram a percepção da maldade, de se ter poder para o bem e se fez o mal, da insensibilidade para atos ruins como se caracterizou o Imperialismo. 

        Um desses livros lidos foi Origens do Totalitarismo - Antissemitismo, Imperialismo, Totalitarismo. Para quem se interesse pelo tema, a análise histórica traz muito mais que uma narrativa.

        Outro livro lido explicou um termo que durante muito tempo foi mencionado por figuras públicas, jornalistas o citaram em artigos fora do contexto original, mas que chamavam a atenção para como situações graves foram transformadas em uma "normalidade banal".  O relato da banalidade do mal virou apenas o termo Banalidade do Mal, que é o que parece estar ocorrendo no Brasil já há uns bons 10 anos.

        Este livro, como o outro que aqui é citado tem uma profundidade que no correr da leitura impõe reflexões, que se aprofundou ainda mais quando virei a página final, pois fiquei muito tempo pensando na sua mensagem, não só as implicações históricas que o nazismo provocou naquela janela do tempo, como do modelo criado por esses seres maus, que tem inspirados muitos poderosos para dominar as massas. Vale a leitura para conhecer o que Hannah Arendt concluiu como Banalidade do Mal, também vale muito pela compreensão que podemos ter para os atos políticos ou das omissões que da política emanam. Da leitura de Eichamnn em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal, uma obra primorosa, pode se espraiar para outras reflexões, como o que ocorre nas perseguições que ocorrem na internet.

        Ainda deixando a minha mente correr sobre este nosso tempo, fez meses, mais de três anos, desde que pensei um romance que terá por base a internet, os haters, as fakes news, as "verdades inventadas", a maldade programada e disseminada sem nenhuma preocupação quem vai ser a vítima. 

       Passei semanas imaginando que escrever um texto curto sobre tal tema seria arriscado para minha tranquilidade, por isso relutava, pois não queria abrir o falso debate que caracteriza nossos tempos sombrios.

        Hoje parece que a realidade, que escrever o que pode estimular a uma reflexão é uma quimera, pois intuo que muitos dos que têm o prazer de criar e de  fazer a maledicência rodar a internet para atingir pessoas, não estão nem aí. São tantas, que se um for atingindo por um processo judicial não faz efeito, como se diz, pedagógico, educativo. É que o conceito de sociedade para tantos, é o conceito de conflito, de confronto, de briga. É na briga que se energizam, não na paz.

        Por causa desse tipo de Banalidade do Mal que muitas pessoas, muitas, muitas, muitas que sequer conheceremos, que sequer nos darão bom dia ou serão indeferentes a nosso boa noite, por estarem voltadas para o celular, serão atingidas pela maldade que corre sem freio pelas redes sociais. 

       Nestes tempos sombrios, em que os algoritmos das redes sociais amplificam e dão uma velocidade absurda à maledicência, que logo se transforma em um destilado de maldade. Como se tivesse sido armazenada por 80 anos, para ser desgustado pelos apreciadores de bebidas deste tipo. Só que não há tal maturação, a malediência gera maldades uma atrás da outra, sequer dá tempo para o defunto esfriar.

        Para milhares de pessoas, ser maledicente já basta. "Ser maledicente já basta em si mesmo."

        Não se importar com o mal que possa fazer a outras pessoas é regra nos dias de hoje. Isto é banal, né?" Para elas e são muitas, isto já preenche a sua "gana de ser gente", de ser parte de "algo maior".  É hoje, foi ontem. 

        Na infância algumas pessoas vizinhas chegavam para conversar com meus pais e eu ficava ouvindo parte daquela conversa, várias vezes papai ordenava que me afastasse. Mas uma das vezes tive a oportunidade de ouvir a conversa inteira, não entendia, mas muitas pessoas tinham em si uma expressão de prazer, quase de gozo ao fazer certos comentários e os levar a maior quantidade possível de pessoas. Era o tempo da pré-história da internet, coisa de 50 anos atrás.

        Livros, pesquisas acadêmicas, artigos jornalísticos, pesquisas qualitativas, percepções dos mais observadores, comuns, como nós, nos dão conta que tal velocidade ocorre por causa da forma de condução das Bigs Techs ao buscar audiência das redes sociais,  onde estimulam o ódio, a discordância, o conflito, o caos* como ferramentas para sequestrar a atenção, transformando a realidade em que vivemos para pior desde que elas ganharam o mundo.

        Como se dizia há muito tempo: Notícia boa não vende. 

        Então? 

        O que fazer?

        Quem pode fazer?

         O que você pode melhorar?


        Por hoje é só, Abraço. 

        Marconi Urquiza

               

                "Sugestão de leitura: A MÁQUINA DO CAOS - Max Fischer".

                 A máquina do caos derruba a cortina dos likes e comportilhamentos e mostra uma sociedade  perigosamente à mercê de forças contrárias a seus interesses (Trecho da quarta capa do livro).

        

O poder revela ou transforma uma pessoa?

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