quinta-feira, 7 de junho de 2018

Zé Simpatia

Tem gente famosa que não é importante. A passagem de cada um pela vida deve contribuir para que, ao final, o mundo não esteja pior do que era antes. As pessoas são lembradas pelo comportamento que tem no trabalho, com os amigos, na família. (Mário Sérgio Cortella)

Creio que todos nós temos milhares de histórias para contar ou para ser lembrado. Vou começar com essa. Filé foi o último apelido que as atendentes da Farmácia Dehon em Bom Conselho deram a Zé Barros, que era o apelido de José Araújo Costa. Mais nome que apelido, todos só o conheciam por Zé Barros.

Mas Filé só foi Filé por que era uma pessoa alegre, expansiva e que adorava se relacionar, contava histórias e piadas. Poderia até ter outro apelido, Zé Simpatia. 

Feita esta pequena apresentação, um pouco de história para compreender minha parte nela. Quando conheci Zé Barros ele já era famoso em Bom Conselho, o Zé Barros Galego, loiro mesmo, loiro de olhos azuis.

Mas a aproximação começou em 1977 com o namoro com sua filha Aparecida, que sete anos após viraria casamento.

Vamos saltar 20 anos no tempo. Certo dia ele disse que iria nos visitar no Paraná, oferecemos a ele passagem de avião, mas recusou categoricamente. O medo de voar não lhe permitia essa ousadia, mas fez outra maior, típica de sua vida, atravessou meio país no lombo de um ônibus.

Pronto para viajar, ligou para a filha e disse que estaria viajando para nossa casa. Só que não tinha ônibus direto de Bom Conselho para Terra Boa, teria que pegar outro ônibus em São Paulo até Campo Mourão no Paraná.

Quando ele ligou e disse que viria sozinho veio o cuidado, ele não sabia ler e a preocupação de ter dificuldade era enorme durante a viagem. Foi um preocupação justa, mas com a capacidade de fazer amizades que tinha ele desenrolou fácil. Pegou até carona quando o ônibus quebrou.

Chegou perto de nossa cidade pela madrugada e de imediato ligou para Cida dizendo que estava na rodoviária de Campo Mourão, saímos para pega-lo uma da manhã, 36 horas desde Pernambuco. Uma curta viagem de  50 quilômetros desde Terra Boa.

Ao entrar no carro foi logo perguntando pelos nossos filhos e em certo momento ele se voltou para Cida e disse algo assim, "olha pedi para Judite fazer uma galinha guizada, coloca-la na farinha para eu vir comendo na viagem e não deixaram, disseram que era feio." Logo outros assuntos entraram na roda e chegamos em casa e a filha registrou o seu desejo, quando ele voltou para Pernambuco ela preparou uma galinha do jeito que ele gostava. Lembro até que ele disse ao telefone: "minha filha, vim comendo de pouquinho até aqui, não passei fome." Nesse tempo já estava diabético e ninguém sabia.

Chegamos em Terra Boa por volta das duas da manhã. Os meninos só viram o avô7 no raiar do dia. Trouxe doce, queijo e outras comidas cuidadosamente embalados para não estragar, aquelas coisas de sertanejo histórico. 

Cida tomou conta do pai e foi apresentar os amigos de Cianorte, de Terra Boa, de Barbosa Ferraz. Alguns dias depois marcamos para viajar para Foz do Iguaçu. Em tempo, todo amigo, parente que vinha nos visitar nós fazíamos questão de mostrar as Cataratas do Iguaçu. Nessa brincadeira, fomos lá seis vezes em oito anos.

Assim fizemos com ele, em um sábado seguimos para lá, primeiro fomos em Ciudad del Leste e depois para as Cataratas do Iguaçu.  Mas Zé Barros não era fã de altura e nem de rio cheio, tudo isso lhe dava um medo enorme, ainda assim, conseguimos fazer parte do passeio pela calçada que ladeia o cânion do rio Iguaçu pelo lado brasileiro até próximo da Garganta do Diabo. Quando fomos chegando perto dela, os respingos das cachoeiras já molhava nossas roupas e o som do rio despencando 70 metros abaixo o assustou e os temores antigos não deixaram ele prosseguir.

Subimos a primeira escada que dava para o estacionamento, ainda convidamos ele para olhar as cachoeiras pela vidraça da estação do elevador, sem acordo. Sentindo que a visita estava terminada eu saí para ir buscar nosso carro que estava no fim do estacionamento do parque. Saí andando devagar, estava um dia abafado, calorento.

Nesse dia seu Zé Barros estava com um chapéu vistoso, de abas largas, do tipo da novela O Rei do Gado, a roupa também era vistosa, nova, gostava de se vestir com elegância, parecia um rico fazendeiro. Na época Silvio Santos tinha um programa de televisão de muito sucesso, inclusive era motivo de muitas brincadeiras Brasil afora.

Enquanto vou caminhando para trazer o carro, Cida e o pai se sentam em um banco sob uma boa sombra de uma árvore. Ele com 68 anos e Cida com 38 anos, era uma diferença de idade que chamava atenção. Eles ficaram juntinhos,  Cida colocou o braço no ombro do pai e ficaram conversando, nisso passa um carro com vários rapazes, que arregalam os olhos e ao ver o coroa com uma mulher bem mais jovem e muito bonita o motorista para o carro e o carona grita: "É namoro ou amizade?" Zé Barros não era de peder uma piada não teve tempo para responder, Cida respondeu antes, "É namoro".  O rapaz deu uma gargalhada e sumiu no mundo e nós seguimos a viagem, gargalhando de vez em quando ao lembrarmos da cena, pai e filha passando por amantes e da expressão de certeza dos rapazes, saindo convictos que o coroa namorava uma novinha. 

Essa pequena história bem humorada não foi exceção, exceção sempre foi ele não tentar fazer o ambiente ser mais leve e alegre, que eu posso mais dizer? Centenas de histórias bem humoradas, por hora fico apenas com essa. 




Abraço,






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