Nesta quarta-feira ao passar pelo cruzamento da Avenida Rosa e Silva com a Rua Santos Dumont, aqui em Recife (PE), me deparei com várias pessoas aguardando o sinal fechar para cruzar apenas a Avenida Rosa e Silva.
Alguns segundos de espera, alguns segundos de uma observação rápida dos viventes que ali aguardavam o momento da travessia. Era por volta do meio dia. Um traje destoou dos demais. A maioria estava de calça jeans ou de calça Leg, logo na frente das pessoas que esperavam eu vi uma mulher de vestido.
Quarta-feira de vestido? Estranhei.
Bem, segundo as minhas observações de andante os vestidos são mais utilizados aqui em Recife nas quintas e nas sextas-feiras. A razão eu não sei. Já imaginei, há muito tempo, que um vestido caberia, como o jeans, como uma das vestes do casual day. O meu conceito para estes vestidos: São roupas cujos cortes estejam na altura ou um pouco acima dos joelhos, tenham aspecto jovial e o tecido seja mais colorido, menos sisudo.
Quando o vestido de tons amarelos, com algumas figuras de outras cores, que davam um toque de classe, me chamou a atenção, eu fui olhar o restante do corpo daquela senhora.
Estava de óculos, grande, clássico, cabelo penteado, com corte na altura do pescoço, solto, mas não esvoaçante.
Com olhar de curioso treinado, eu fixei a minha atenção naquela mulher. Cerca de 60 anos, talvez um pouco mais. Deduzi a idade por causa de alguma flacidez na pele das pernas. Com o peso normal, sem barriga. Não tinha adereços, o batom era discreto, mas não de cor neutra, um leve vermelho. No rosto uma leve maquiagem, se é que fosse maquiagem.
Corri a vista e não vi nenhuma jóia. Quando a vista desceu para os braços eu vi na sua mão esquerda as duas alianças juntas no dedo anelar. Aí voltei para o rosto, sério.
Saí andando para casa, mais uns 200 metros de um caminho em que a imaginação tomou conta. Ela é viúva. Ainda utiliza as alianças, poderia tê-las tirado, as manteve, valoriza seu estado de viuvez. Manter as alianças poderia significar ter um espírito que valoriza e respeita as tradições, ou no meio social em que vive, sinalizar seu novo estado civil é cobrado ou é importante. Por fim, imaginei que ela poderia amar muito o seu cônjuge.
O rosto sério indicava que ela ainda sente muito, mas o vestido jovial parecia revelar que ela começou a superar. O corpo bem cuidado, demonstrado pelo peso ideal e a pele bem tratada parecia indicar que a tristeza começou a ser bem administrada. O luto agora, parecia estar suavizado.
Após alguns minutos fui me aproximando da minha morada, não visualizei ela andando e imaginei a sua mão esquerda se erguendo, ajeitando os óculos, mostrando o brilho das duas alianças, depois passando a mão nos cabelos e, com ela espalmada, passou de leve sobre o vestido.
Quando entrei no prédio me lembrei de uma frase de Ariano Suassuna, na qual ele oferece a sua sabedoria:
Tenho duas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver.
O sinal abriu, ela atravessou a avenida e ....
Abraço,
Marconi.
Observar e compartilhar o que se observa também são boas formas de enfrentar "essa dura e fascinante tarefa de viver". Parabéns Marconi.
ResponderExcluirObrigado. Abraço.
ExcluirTexto muito bom.
ResponderExcluirObrigado, abraço.
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