quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Vamos falar sobre Política e a preguiça de pensar





Há uma frase de que gosto muito e que, para mim, é a expressão da presença política: “Os ausentes nunca têm razão”. Embora pudessem estar com alguma razão, eles a perdem pelo fato de se ausentarem.


A ideia para o título desta crônica veio do filme: "Precisamos falar sobre o Kevin." Kevin é o filho da personagem Eva que mata o pai e a irmã à flechadas. Uma tragédia que poderia ser evitada, se Eva tivesse provocado o marido para conversar sobre a personalidade maléfica do filho.

Aqui dou uma quebrada. Algumas vezes, creio que muito dos leitores devam ter ouvido algo assim: "Eu não avisei!". Ocorreu o aviso e assim mesmo o erro foi cometido.

Desde o início da Operação Lava Jato para o bem ou para o mal, ou para ambas as situações, em concomitância, a nossa opinião foi sendo conduzida, quase como uma regra, a favor dela e contra os "bandidos", ou contra os elementos fáticos dela e dos seus protagonistas. Elementos fáticos de fato e os elementos fáticos de "não fatos".  Em resumo, uma oposição entre os fatos comprovados e os "fatos criados por uma narrativa deliberada", intencionados para atingir um objetivo.

Antes disto, a maioria da população se cindiu em a favor e contra. A partir de 2013, tal cisão acabou conduzindo o pensamento do brasileiro para ser um anti, UM ANTI TUDO QUE NÃO FOSSE A SUA FORMA DE VER O MUNDO.

Se alguém olhar os fatos e os interpreta diferente, ele é contra, se não opina, o viés do ANTI TUDO, também interpreta como contra ao MEU PENSAMENTO.  Vou enfatizar, MEU PENSAMENTO. 

Neste ponto vou abrir um espaço para uma experiência pessoal. Sou uma mistura de credulidade com um ceticismo forte. Sou crédulo por que tendo a confiar nas pessoas e sou cético por necessidade. Fui muito vezes enganado ao acreditar que havia boa vontade em muitas pessoas. 

A experiência me fez quase acreditar que o pensamento dos telejornais era o meu. Passei meses assistindo as informações que a Lava Jato produzia. De tanto ouvir eu fui deixando de ponderar aquilo que eu recebia por meio das sucessivas edições do Jornal Nacional, Jornal da Record, Globonews, sites G1, UOL, Estadão, a revista Veja e outros noticiosos menos relevantes. Todos pareciam repetir as mesmas informações, até a Rádio Jornal, que tendo a escutar muito, vinha com o mesmo tom. 

Em certo momento, eu senti que a minha mente estava sendo dominada, nela já não tinha espaço para fazer uma reflexão, até que certo dia eu parei: "Não vou mais assistir e ler esses noticiários." Parei e passei muitos meses sem assisti-los ou os ler.  Mas o processo era massacrante, então comecei a buscar outros meios de me informar ou ouvir opiniões diferentes, que me propiciasse uma certa capacidade de ponderar o quanto se ouvia era verdadeiro, inconteste, ou haviam opiniões diferentes. Assim eu fui saindo do lameiro que me prendia no pensamento único. O MEU PENSAMENTO agora era múltiplo. Comecei a perceber nuances e a minha alma não foi domada.

Bem, esta foi a minha realidade. Ainda vez por outra eu penso na frase de Nelson Rodrigues: "Toda unanimidade é burra"; eu acho que ela é viciante. Provoca um bloqueio que torna muita gente incapaz de ouvir o aviso: "Eu não disse!" Não é o meu caso viver avisando, pois não sou profeta e nem adivinho.

Por causa do acirramento desta forma de reagir, do radicalismo que muita gente se porta ao tratar do assunto. Da prática corrente do linchamento sem consequência nas redes sociais. Da instigação do ódio contra quem quer que seja, contra quem quer que não tenha dado motivo pessoal, insuflado por uma retórica que domina o bom senso e pelo uso da tecnologia que não dar nenhum descanso à mente dos adoradores do novo bezerro de ouro: A raiva contra qualquer humano que seja diferente do nosso modo de ver. Por causas destas e de outras circunstâncias, a maioria tem deixando de discutir uma coisa de imensa importância: A POLÍTICA.

Vamos tentar ilustrar.

 Na "política das eleições", tudo que os candidatos querem é insuflar as nossas emoções mais primárias e universais: o medo, a raiva, o ódio, a vontade de brigar, a vontade de matar, a idolatria. Com isto, muitas vezes dominam os pensamentos e provocam um impacto duradouro na nossa capacidade de sermos tolerantes.  Isto também tem um efeito, na era de antes das eleições turbinadas pela internet ainda se via alguns candidatos mostrarem seu programa de governo. Isto, por hora, perdeu importância.

Na "política após as eleições”, a gente, nobres eleitores, viramos passageiros. Muitas decisões parecem mirar a maior parte da sociedade, mas miram exatamente o contrário. Cá de longe, ficamos apenas no "OBA!; ÔHHH! EITAAAA!. E muitas vezes apenas lamentando. 

Por causa das decisões políticas, que são diárias, a gente precisa falar de Política. Não da forma doentia e viciante como costumar ocorrer. Mas do impacto que ela tem nas nossas vidas. Vejam alguns exemplos:
- Quando falta apoio para salvaguardar o oceano? Foi uma decisão política que decidiu.
- Quanto se abriu de todo mundo andar armado? Foi uma decisão política.
- Quando se fez a reforma da previdência?
- Quando se constrói uma estrada?
- Quando se dá subsidio a uma indústria?
- Quando se criou o SUS? 
- Quando se privatiza uma empresa pública?
- Quando se quer transformar a nossa economia para um modelo diferente?
- Quando se constrói e se mantem em funcionamento um hospital público?
- Quando se cria uma universidade pública ou se estrangula ela com falta de recursos?

Basta imaginar um pouco. Basta imaginar um pouco para ver como não podemos nos omitir.

A Política precede a economia, a economia favorece ou desfavorece um político, mas a Política e a força do estado é que podem transformar a minha vida, a sua, de muitas pessoas para melhor ou para pior.

Pois bem, é sobre estes aspectos da Política que a gente precisa conversar. Discutir para compreender. Discutir para não sermos passageiros de uma agonia, que às vezes se prenuncia sem nos darmos conta. 

Vamos discutir Política sem apaixonar, pois, sem a cegueira da paixão poderemos ver com toda clareza o que é discurso, retórica e o que é fato ou o que certos discursos prenunciam nas entrelinhas. 

Mesmo distantes, mas ao se ter consciência da realidade política, podemos usar os meios digitais para dizer aos políticos como estamos vendo a sua atuação e assim obter um mínimo de capacidade de não sermos meros passageiros, pois nos dias atuais somos meros fantoches, influenciados por mensagens bombardeadas diariamente, incessantemente, gerando na nossa mente a pior das acomodações: A preguiça de pensar.

Abraço, 

Marconi 

PS:
Uma resenha sobre o filme "Precisamos conversar sobre o Kevin", neste link:


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