sexta-feira, 18 de junho de 2021

OUVI UM TOQUE DA SANFONA

 


OUVI UM TOQUE DA SANFONA


Antes desta

Quarentena

Junho era maratona

Mas como não tem

Forró

Por causa desse

Corona

Durante essa

Pandemia

Ouço em sonho todo

UM TOQUE D’UMA

SANFONA.

        Poeta Ademar Rafael Ferreira

Cronista: Djalma Xavier

    Fazia tanto tempo que não se via uma coisa assim. Os assuntos são pandemia, falta de vacinas, falta de muita coisa... Só tristeza, só dor, mas ocorreu algo muito alegre, muito bom. Bom demais!

    Véspera da festa de Santo Antônio. Acordei cedo e fui tomar meu café pra espantar o sono e esquentar o friozinho gostoso que raras vezes aparece em Recife. Pela janela da cozinha ouvi um som que fazia tempo que não escutava. Olhei pra rua e, daqui do 12º andar, vi o pátio de uma escolinha infantil, todo embandeirado e enfeitado com balões de papel. É de lá que vinha o som da sanfona, acompanhada pelo triângulo e a zabumba.

    O sanfoneiro e cantor entoava a todos pulmões: “Olha pro céu, meu amor...” Vixe Maria! Isso arrepia o coração de quem tem alma nordestina! Começaram a chegar lindas menininhas de trancinhas e vestidos de chita e matutinhos com bigode pintado de lápis, camisa xadrez e chapéu de palha na cabeça.

    Os pais pareciam orgulhosos e felizes por suas crianças estarem no clima junino e com esperanças renovadas de que as coisas voltem ao normal.

    Enquanto isso, o sanfoneiro continuava a tocar e cantar, animando a escolinha e as proximidades. O som era alto, de boa qualidade, e chegava a mais de um quarteirão de distância. Ao longe, vi uma senhora que limpava sua calçada e, ao escutar uma música de Gonzagão, perdeu a vergonha e começou a dançar forró com a vassoura. Em frente à escola, na varanda de um edifício alto, um casal se animou e começou a dançar o xote “Ana Maria”, gravado pelo forrozeiro e cantador Santana.

    A emoção veio à flor da pele quando o sanfoneiro executou com maestria, do mestre Luiz Gonzaga, arrepiando-me ao ouvir “Quando o verde de teus olhos, se espalhar na plantação...”, emoção que se completou quando o cantor entoou “...mas felizmente Deus agora se alembrou// de mandar chuva pr’esse sertão sofredor//... Terra molhada, mato verde, que riqueza... Ai, ai, o povo alegre, mais alegre a natureza.” Frases de duas das mais belas canções até hoje gravadas no nosso cancioneiro: Asa Branca e A Volta da Asa Branca. Impossível não se emocionar com esses versos, com sua beleza poética.

    E as crianças continuaram a chegar. Os pais com celulares registrando tudo, deu pra sentir que há uma esperança no ar.

    Nós, nordestinos em geral e sertanejos em particular, aprendemos a conjugar o verbo esperançar desde pequeninos! Ouvimos de nossos pais que a seca não é pra sempre, que a chuva vem, que o verde recobrirá a caatinga árida e que haverá fartura à mesa. Esse sanfoneiro anônimo, com sua arte e sua emoção, fez-me um bem enorme e deu-me a certeza que isso tudo vai passar!

16 comentários:

  1. Após essa tempestade/Nós cruzaremos a ponte/Ganharemos liberdade/Junto com novo horizonte.
    Parabéns pelo texto.

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  2. Que texto gostoso e leve de ler! Precisamos mais disso hoje em dia. Fiquei arrepiada só de imaginar a cena... Muito orgulho do meu pai cronista!
    Com fé e o choro de uma sanfona, temos a certeza de que tudo isso vai passar!

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    1. Obrigado, Laisinha! Você é seus irmãos foram fonte de inspiração para a crônica. Bjs

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  3. Uma das melhores coisas do mundo são as descobertas. E a maior que tive hoje foi meu tio cronista. Parabéns meu querido Tio, belo texto, leve como sua alma e profundo como seu caráter

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    1. Obrigado, meu sobrinho Claudio! Eu também estou me descobrindo, me reinventando o tempo todo. Abc.

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  4. Que texto lindo meu irmão não sabia que tinha um mano cronista estou orgulhosa de você, prepare-se para fazer uma crônica do nosso reencontro e o fim da pandemia,vai ser muitos beijos e abraços do reencontro da família 😘❤️👏👏👏

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    1. Obrigado, Fátima! Faremos festas, crônicas e muitos reencontros, com fé em Deus.

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  5. Valeu amigo Djalma, nunca é tarde para deixar florar esse espírito de escritor, nativo dos sertanejos nascidos nas beiradas do velho Pajeú, berço da poesia pernambucana. Parabéns pelo belo texto para momento que vivemos!!! Abração!!

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  6. Linda crônica, foi de arrepiar, parabéns e um bom dia.

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  7. Esqueci de colocar meu nome no agradecimento, Lucineide Vieira Barros.

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  8. Nossos parabéns Djalma. Que grande alegria vê-lo escrevendo com tanto sentimento. Abraços e grato pela generosidade do Marconi em compartilhar o espaço.

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