Trabalhar é minha sina
Eu gosto mesmo é d'ocê Estava a caminho da posse no Banco do Brasil. Tudo novo, uma vida nova, um despontar para a descoberta do mundo do trabalho, o que me obrigou a me virar pelo avesso, criar amizades, vencer a timidez e a lentidão ao datilografar, uma enorme exigência daqueles tempos.
Não se admire se um dia um beija-flor invadir
A porta da tua casa, te der um beijo e partir
Fui eu que mandei o beijo
Que é pra matar meu desejo
Faz tempo que eu não te vejo
Ai que saudade d'ocê
Esse beija-flor era os cinco minutos de telefonema diário. Toda noite ia ao posto telefônico ligar, diminuir um pouquinho a enorme saudade, bem que poderia ter dito "Ai que saudade d´ôce", mas esse era o sentimento, quase uma dor que aliviava ao ouvir a sua voz.
Se um dia você se lembrar, escreva uma carta pra mim
Bote logo no correio, com frases dizendo assim
Faz tempo que eu não te vejo
Quero matar meu desejo
Te mando um monte de beijo
Ai que saudade sem fim
E as pingadas cartinhas que levavam dias para chegar, que eram aberta com sofriguidão e lidas com vagar até o beijo que encerrava a missiva. Um beijo que representava um dilúvio de beijos e abraços, das mãos ansiosas e suadas pela emoção de um encontro que demorava dias, às vezes quinzenas, pois a grana teimava em acabar antes do dia 20. O dia do salário.
E na sexta-feira à noite o beija-flor me acompanhava no ônibus da Progresso, que tonto de sono descia às cinco da manhã na rodoviária de Recife e corria feito doido até a rua Barão de São Borja para aplacar a saudade, que no domingo perto da meia-noite, era renovada assim:
Eu chorando pela estrada, mas o que eu posso fazer?
Trabalhar é minha sina
Eu gosto mesmo é d'ocê.
Foi a minha sina durante três longos anos, até que casamos a saudade ficou a passo de um beijo.
Aí a saudade ficou a um passo de um beijo.
Então o tempo passou e hoje leio que Vital Farias, o compositar dessa bela canção, morreu e a recordação veio com toda a energia, como um looping, a repetição que ocorria todas as vezes que a ouvia.
Um pedaço da vida, das saudades que embalaram meu coração ao longo da vida e eu fui buscar mais uma vez ouvir a canção e trazer este pequeno fragmento dos 65 anos de vida.
Bem, por hora é só.
Abração, Marconi Urquiza
Atenção
Vamos escutar Vital Farias com Rolando Boldrin nesse vídeo do Programa Sr. Brasil, dois grandes artistas em um momento único e feliz.
Clique no link e assista ao vídeo:
Espetacular meu amigo. Vital Farias deixa uma obra vasta ele e Ariano estão no topo dos defensores da cultura raiz, Taperoá nos deu esses dois presentes.
ResponderExcluirAdemar, muito obrigado pelo comentário.
ExcluirFoi bem assim mesmo! Era muita saudades e muitas cartas ❤️
ResponderExcluirMaravilha!
ExcluirQue Deus dê a Vital Novaes um lugar na morada eterna, e ao amigo Marconi a inspiração e arte de tornar a saudade moderna.
ResponderExcluirÓtima sexta-feira amanheceu então acorda, e vamos beber porque comer engorda.
Muito obrigado pela inspiração.
ExcluirValeu Marconi,
ResponderExcluirBelíssima crônica, belíssima recordação de amor e belíssima música do nobre Vital Farias, cantor paraibano que embalou gerações e deixa saudades. "Ai que saudade d'ocê"
Simbora curtir a vida com sabedoria e embalado com as belas músicas deixadas por esse paraibano arretado e que hoje reina e canta no céu.
Oceano, valeu! Muito obrigado pelo estímulo.
ExcluirParabéns! Excelente crônica além de deixar o coração de Cida derretido.
ResponderExcluirValeu!
ExcluirMais que tudo, esta bela crônica tem a ver com o slogan do blog: tantas vezes chegamos; tantas vezes precisamos ir além. Ir além, por exemplo, é chegar na plenitude da vida e, numa sexta-feira qualquer, compartilhar um sentimento.
ResponderExcluirHayton, até parei e li seu comentário. Faz tanto tempo que coloquei esse slogan que sequer prestava atenção nele. Seu comentário o pôs novamente na minha atenção. Muito obrigado.
ExcluirÓtima crônica, Marconi, testemunha de um amor que não ficou só na saudade.
ResponderExcluirValeu!
ExcluirBelíssima crônica.
ResponderExcluirTambém me alimentei dessa fonte, que somente românticos trazem consigo, porém um pouco diferente pois estava apenas a 120 quilômetros de Recife onde deixava minha família e ia morto de saudades para o trabalho, por quatro anos...
João, muito obrigado!
ExcluirMarconi, a crônica de hoje é belíssima por puros sentimentos que foram externados de amor, emoção, despedidas e reencontros, mas principalmente por você ter dado “vida” à melodia, pois tantas vezes a ouvimos apenas como uma trilha sonora, porém foi feita uma resignação transmitindo com muita delicadeza a dor de uma saudade e trazendo a nostalgia do prazer e alívio que ocorria ao se receber uma carta.
ResponderExcluirNelson, rapaz! Que belo comentário. Muito obrigado.
ExcluirParabens Marconi! Mais uma bela crônica
ResponderExcluirValeu!
ExcluirFrança. Parabéns Marconi! Mais uma bela crônica.
ResponderExcluirAmigo França. Muito obrigado.
ExcluirMestre Marconi, arrebentou a boca do balão. Sextou com uma crônica, envolvendo muito amor, paixão, saudade, viagens, trabalho, cartas de amores. Quem já não passou por essas etapas da vida?
ResponderExcluirE os arremates a cada parágrafo, espetaculares.
Trabalhar é minha sina
Eu gosto mesmo é d’ocê.
Valeu, mestre Marconi!
Edivaldo, me empolga seus comentários. São belos e sensíveis. Abração.
ExcluirA música e seu poder de produzir memórias... O cronista e a sua arte de traduzir o cotidiano com sensibilidade... Parabéns, Marconi, pela capacidade de nos fazer seguir com você nessa saudade.
ResponderExcluirPaula, muito obrigado. Seu comentário foi mais o que desejava, queria compartilhar e dizer que aquela canção, tão bela, deu sentido a muita coisa de minha vida. Abração.
ExcluirE o Banco do Brasil foi testemunha de tantas histórias de amor , algumas bem assim com final feliz, e outras nem tiveram fim, porque não foram vividas…
ResponderExcluirValeu! Pura verdade. Obrigado
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