quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

RETROSPECTIVA SENSORIAL



                                            Poema de Ademar Rafael Ferreira
      Mesmo com dores terríveis
       No joelho, punho e mão
       Com insônia que perturba
       A mente e o coração.
       Sei que após a tempestade
       Dias melhores virão.

       Que é isso de sensorial? 
       Na falta de uma palavra no vocabulário e da preguiça em consultar dicionários eu deixei assim mesmo. Nos acostumamos ver na tevê programas de retrospectivas,  em um ano em que a sociedade brasileira andou de braço dado com a teimosia e com a morte, muitas evitáveis. 

       Pois bem, cabe a cada um fazer a sua. Eu compartilho a minha.

      Começo pelo Medo.  Como senti! Aquele medo raiz, ancestral. Mas em vez de ter correr para se salvar, a salvação foi ficar parado.  Em casa. 

       Veio a insegurança. E o futuro? Qual o sentido de vida para quem está com 61 anos. Achá-lo, transformar em objetivo e agir. Felizmente estava em andamento a liberação da escrita como razão de viver. Falta-me ser lido. De março para dezembro escrevi 100 páginas de um romance.  Escrevi 48 contos e umas 30 crônicas, totalizando mais 300 páginas. Tudo organizado,  são três livros. 

      Mas aí veio o sufoco, um filho entrou na fila do desemprego.  O futuro dos meus filhos são o meu. Eles estando bem,  eu consigo levar a vida.

     A insegurança veio forte. Era hora de evitar que a sanidade mental virasse insanidade. Após  três anos, eu era quase um rato de academia.  Frequência de três a quatro vezes por semana. O físico em setembro estava definhando.  Depois  de mais um ano sem sentir as dores da artrose,  eu voltei a tê-las.

     Olhava o mundo pelo quadrado da janela, isto esgotou. Já não era suficiente.  Comecei a me refugiar na leitura das mensagens boas, o ruim me dava mal-estar. Fugia na irrealidade do mundo perfeito. Recusei o voluntariado para escrever o obituário dos mortos pela pandemia. Escapou uma, a do primo Ronaldo Tenório. 

      Em setembro estourei às costas,  machuquei o joelho direito, o punho começou a doer, a insônia se tornou péssima.  O corpo reclamava...  Não,  a vida reclamava. 

     Contrariando o senso comum,  criei os melhores contos,  resgatei por meio da fantasia imagens que andava, sei lá onde. Um passarinho que entrou na casa, o vento que se tornou personagem. A empregada que tem o mesmo odor corporal da patroa e por aí fui. Havia escrito dois romances, neles a vida é crua. Nos contos a escrita é bem diferente das dos romances, a leveza é a marca. Era de leveza que eu precisava.

     Passei a olhar o Mundo pelo Cuidado e pela Liberdade Provisória. Sabe, qualquer descuido,  podemos estar mortos em pouco tempo ou podemos ser assassinos, sem sabermos. O cuidado é mais que uma faceta da nossa vida mundana. A liberdade é vigiada pelo vírus.  

     Antes aprendi olhando,  atendendo , sendo um ouvido atento e respeitoso para os clientes, alguns doentes, vários terminais, especialmente os que chegavam na agência do Banco do Brasil,  Agamenon Magalhães,  em Recife.  Aqueles anos me deram um sentido de vida canino, em uma carreira que havia entrado no ocaso. Saí dos anos em que lá estive ciente que ser empático depende de um esforço permanente, fabulosamente gratificante. "O simples usar da máscara pode ter o mesmo sentido". Redescobri isto em 2020.

Que nos encontremos em 2021!




Feliz o AnoNovo, Iluminado como nunca.
Recife, 31/dez/2020

Marconi Urquiza 




Um comentário:

  1. Esta foto desenhada no texto cabe em muitas molduras, serve para muitos habitantes do planeta terra que venha 2021.

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