sexta-feira, 4 de maio de 2018

Um número a menos, o caso da chuteira 42

    A bola que lancei quando brincava no parque ainda não tocou o chão.... Frase de Dylan Thomas.

    A ciência descreve as coisas como são; a arte, como são sentidas, como se sente que são.... Frase de Fernando Pessoa.

   Nesta semana o amigo Djalma Xavier teve a consideração de copiar e me enviar uma crônica da Folha de São Paulo em que o autor falava de futebol, das velhas e novas peladas. No seu post no Whatsapp ele comentou que a crônica o fez lembrar do meu estilo de escrever e da predileção pelo  futebol. Foi muita gentileza dele.

    O estilo era mesmo parecido, um jeito de escrever que o autor Ricardo Araújo Pereira foi trazendo na crônica Perigo: importantes lições de vida suavemente a saudade, em gotinhas da flor de laranjeira. Recordava dos seus 30 anos e das suas peladas dessa época e como enfrentou a descrença de jogar futebol já veterano, vencendo o medo de infartar, trazendo felicidade em forma de lamento por causa desse medo e do tempo perdido. Pois, como diz Alceu Valença, o tempo não tem parada, só o melhor aproveitamento nos fará não tem ter arrependimentos pelo mal uso.

     Aquele momento narrado pelo cronista Ricardo deu um nó nas minhas reflexões, o momento de vida que ele colocou na sua crônica entortou minhas lembranças, inclusive do episódio ocorrido no final da pelada da última segunda-feira que arrebentou aquela portinha miúda que eu não queria abrir, que ela sempre esteja trancada, pois a força que segura pode ser muitas vezes maior que os freios que meu coração tem, os freios do controle, da bondade e do perdão. É quase um Vesúvio. Enfim, o Vesúvio voltou a correr no leito tranquilo da paz.

    Essa portinha aberta e depois fechada a custo de muito esforço  me fez lembrar de muitos momentos na vida onde a fleuma foi meu escudo contra o abuso. Mas sempre que penso no assunto, sempre que algo desencadeia algumas reflexões sinto como tive dificuldade de lidar com pessoas abusivas, que por mais que eu sinalizasse a minha irritação mais eu era provocado. Para muitos, a interpretação era de fraqueza, até que a portinha desse Vesúvio soltava as suas lavas incandescentes e felizmente, apenas, na forma de palavras. Ainda bem.

    Este é um momento da minha vida, controlar firmemente o fluxo dessa lava vulcânica e viver feliz.

     Mas a crônica não trouxe apenas esse processo de autoconhecimento, me fez viajar em mais de 20 anos.

    Naquela época, naquela turbilhão que foi o Plano de Demissão Voluntária e "pressionado" de 1995. Em meados de agosto daquele ano e na maior pressa eu estava no Paraná, deixando em Pernambuco a esposa e os três meninos pequenos, nos encontramos apenas em dezembro.

     Cheguei lá em uma terça-feira, fui tomando pé da situação do trabalho, logo sou perguntado se gostava de futebol, já me avisaram que nos sábados à tarde havia na Associação Atlética Banco do Brasil - AABB a pelada do final de semana. Aceitei o convite e ficou combinado eu pegar carona com Mário Yorinori. 

    No sábado pela manhã saí pelo pequeno comércio para procurar uma chuteira de futebol society, até que achei uma Adidas e completei o traje com o meião e caneleiras da mesma marca. Equipado esperei a hora da carona chegar.

   Barbosa Ferraz é uma cidade quebrada, como se diz na gíria do Paraná. Quebrada significa ser uma cidade com morros. 

    Chegou três da tarde eu fiquei na frente do hotel onde estava hospedado, umas três e meia chegou Mário e nós seguimos para a AABB. Enfrentaríamos o melhor time de society da cidade, o Habilidade. Jogamos inúmeras vezes contra eles, tocavam tanta a bola que me fez comparar com o tic-taca do Barcelona. Acho que Guardiola veio tomar aulas com aquela turma do Habilidade.

     Só para lembrar. Barbosa Ferraz é quebrada, o local da AABB tem também suas ladeiras. Mário parou o carro na rua ao lado e nós entramos no clube. Primeiro a gente subiu, passou pelo galpão onde ficava a churrasqueira e o pequeno bar, subimos só um pouquinho e começamos a descer por uma trilha, alguns metros adiante, por meio dos galhos das árvores comecei a ver o verde do gramado, parecia um tapete e era um tapete.  Entrei nele e caminhei descalço um tempão. Não sentia a areia sob o pés, mas a umidade da grama e  via a marca das minhas pisadas sobre ela.

     Campo gramado, um luxo para mim, campo integral e em bom estado eu só havia jogado apenas na Universidade Federal Rural de Pernambuco em 1981. Todo o resto era "taco" de capim, pedacinho de mato que imitava grama de campo de futebol.

   Uns dez minutos depois começaram a chegar os jogadores e Mário gentilmente foi me apresentando. 

    Feita a apresentação fomos nos arrumar. Sentei no gramado e fiz todo aquele ritual que até hoje faço. Coloco nos pés uma meia fina, social, a caneleira, o meião, a tornozeleira e depois a chuteira. Naquele dia a chuteira estava ali ao meu lado, novinha, com o couro e a lona ainda preto e cinza. Marca boa, produto bom. Parece que hesitei, mas não foi por pirangagem de gastar a chuteira nova, mas aí comecei ouvir o som dos chutes na bola. Era hora de calça-la. 

     Calcei, levantei, dei aqueles bicudinhos no gramado para melhor acomodar os pés dentro dela, nem precisava, nem efeito fez. Dei um corridinha, apertei mais o passo ao redor do campo, já estava razoavelmente aquecido e chegou a hora de organizar o time. "Tu joga onde?" Ao me perguntarem eu já tinha visto um jogador ocupando a faixa do campo preferida, "eu jogo de lateral esquerdo", assim fui caminhando para lá. Naqueles 15 metros de caminhada eu ainda tinha esperança de que os pés não reclamassem, só reclamou um pouco e como chegou a hora de começar a pelada, lá estava eu pertinho das grevílias, na parte mais macia do campo.

      Finalmente a bola rola e eu, a cada corrida, parava e dava um picudinho na grama e assim joguei bem uma hora, quando a pelada acabou aquele número a menos havia mudado a cor dos meus pés, as unhas estavam roxas e o dorso dos pés encarnados. Assim inaugurei, pela secura de jogar bola, a chuteira 42 em um pé 43.


Abraço,
         

 

sexta-feira, 27 de abril de 2018

No espremido das linhas (Um mentira dá uma volta inteira ao mundo ...)

 
Uma mentira dá uma volta inteira ao mundo antes mesmo de a verdade ter oportunidade de se vestir.... Frase de Winston Churchill.

   Quando já escrevia esta crônica me lembrei do livro de Carlos Heitor Cony intitulado de O Adiantado da Hora. Este título me encanta e por causa dele alterei o título desta crônica. 

   Hoje vou tratar um pouco a respeito das fake news sob a perspectiva de não ser enganado e transformado em mero passageiro.

   Ela começa com algumas passagens autobiográficas, de uma curiosidade imanente com as palavras e para os ditos, principalmente os ditos escondidos das palavras postas ao ouvinte.

   A história é o seguinte, em certo momento eu comecei a querer saber mais do que os lábios dos meus chefes diziam e comecei a ir atrás das entrelinhas que estavam nos contextos, nas palavras de assessores, nos boatos, que mesmo administrados deixavam escapar alguma coisa  e com isso tentava adivinhar o futuro. Foi uma leitura muito rudimentar de cenários. Tal prática me encantou  e encantou mais quando acertos espaçados começaram a ocorrer, até que o aqui e acolá foi aumentando a frequência e os cenários percebidos no microcosmo da empresa onde labutava foram se mostrando na prática.

   Fiz isso durante muito tempo, sem nenhum método científico, só com base na observação e na intuição. Método científico eu só conheci em 2012, a Análise de Conteúdo.

   Voltando ao passado, lembro que por volta de 2002 chegou um novo gerente regional e ele enviou para todas as unidades de negócios uma carta de apresentação. A li cuidadosamente, marcando palavras, trechos de frases, como se estivesse marcando o discurso e fosse guardando as frases pela entonação das palavras.  Quando terminei a leitura eu pedi ao amigo Alexandre que lesse também para depois trocarmos impressões.  Uma palavra chamou muito a nossa atenção, ele se colocava como um soldado. Soldado? Um batalhador incansável na busca do resultados para empresa na qual trabalharmos, eis a nossa interpretação. 

   O tempo passou, mais de 15 anos depois, outro chefe se apresentou por meio de uma carta impressa, nada de e-mail. Tudo foi pensado para causar impacto. Carta de intenções em papel grosso, personalizado, de cor amarela e com letras em negrito e graúdas, com uma mensagem de firmeza moral e negocial diante do conteúdo aparente.   Neste caso a leitura do espremido das linhas não me deu nada, nem a sensação de que ele era um ser pretensioso. 

   Ao final de três anos tudo havia sido tão coerente com o teor daquela carta, com suas promessas e certezas, com tudo parecendo honesto,  havia sido cumprido cada ponto, com exceção do  que não estava escrito. Entre os pontos que não estavam escrito o principal se refere à realização de negócios reais. Muitos números foram tão brilhantemente maquiados que era praticamente impossível perceber a maquiagem sem uma análise minuciosa ou sem o conhecimento dos métodos. O fato é que os números vazaram com apenas alguns meses após sua saída da unidade. Não foi a leitura do espremido das linhas da sua carta que me trouxe  essa convicção, foi o contexto e estar dentro dele, observando as ações. No entanto, nem sempre se pode ser uma testemunha como fui. 

   Em uma eleição, frequentemente o eleitor é mero passageiro.

   Na semana passada um grupo de amigos se encontrou e logo surgiu o assunto que era a ordem do dia para esse grupo de  aposentados: A eleição para a diretoria da sua caixa de previdência. Logo um deles começou a comentar e analisar as chapas, entre as muitas observações uma frase marcou a conversa, algo que dizia assim:  os currículos não garantem o bom resultado futuro, eu expando esta frase, os melhores currículos não garantem que os comportamentos dos componentes da chapa que for eleita serão  éticos, ao menos isso. Mas intuo que para escolher melhor a gente precisa fazer uma leitura nos espremidos das linhas das palavras faladas, escritas e percebidas. Empolado? Com certeza. Em resumo: É preciso conhecer as pessoas e não os personagens.

   Vamos agora para as campanhas das eleições amplas (que já ocorrem há tempos). Nelas a intensidade da  comunicação, a força da mensagem positiva, a força arrasadora das fake news e nossa tendência em aceitarmos, quase sem freios mentais, as mentiras que derrubam as reputações e que mudam a nossa percepção da realidade, por isso é uma arma plenamente utilizada e agora, com a internet, de forma avassaladora.

  Agora vamos ao indivíduo, ou a nós mesmos, isolado, fragmentado, acreditando ou induzido a acreditar ser o centro de tudo o que ocorre na terra, o ser mais importante do mundo, receptor de mensagens que provocam turbilhões de emoções, levando o individuo a se filiar com pessoas que têm as mesmas crenças e que são igualmente fragmentadas, manipuláveis ou já manipuladas, tendo até mesmo  a certeza de serem um feixe de varas e não uma mera vara, quebradiça.

   O que nós somos, fantoches? Quem sabe? Podemos ser sem que se perceba, pois quem pode transformar pessoas em zumbis tem a seu serviço os recursos da comunicação de massa, hoje amplamente inseridos nas redes sociais e tão facilmente replicados pelo Whatsapp.

  Uma questão crítica é que em eleições o cidadão frequentemente se transforma em mero passageiro. 

    Como um eleitor pode minimizar isso, não ser mero passageiro? Buscando as pontas da verdade, deixando de lado as mensagens factoides,   juntando os pontos e achando o real perfil dos candidatos ao buscar os históricos dessas pessoas, que se transformam em personagens e vestem uma máscara como aquele chefe com quem trabalhei. 

    O negócio é espremer das linhas da vida um modo de não ser enganado. Em resumo, repito: É preciso conhecer as pessoas e não os personagens.                             

Abraço,

Post scriptum: Para conhecer outra opinião a respeito das fake news leia:
Fake news. Ambiência digital e os novos modos de ser

sexta-feira, 20 de abril de 2018

Saudade dos meus fantasminhas

Só posso escrever o que sou. E se os personagens se comportam de modos diferentes, é porque não sou um só.... Frase de Graciliano Ramos.     
     Praticamente há três meses abandonei o meu povo, nem bom dia, nem boa tarde, imagine boa noite! Nada.

     Tresontonte me dei conta que senti saudade. Foram dois cursos, dezenas de plantões, uma enormidade de rascunhos de crônicas, revisões e mais revisões, muitas leituras de cronistas renomados, viagens, filmes e leituras diversas na internet e tudo foi ficando do jeito que a mente preguiçosa gosta, só receber e nada de criar.

       Pois bem, também tresontonte, cheio de tédio, nesse trabalho que me serve como uma terapia, eu abri um site de livros gratuitos e tentei ler algumas crônicas. Só que esse tédio matou a iniciativa junto com o mal que a internet provoca, a inconstância e a fragmentação de qualquer concentração mínima para a leitura de um texto, mesmo curto, como uma crônica. A maioria, nos dias de hoje, mal consegue ler e compreender os 280 toques de um Twitter. Não que falte cultura ou vocabulário, falta mesmo é paciência.

     
Na semana passada o colega Bráulio falou que ao ir a igreja fica imaginando  como foi a vida dos fiéis. Contou, que certa vez, se surpreendeu ao ir a uma missa na Igreja do Rosário dos Pretos. A missa foi em uma quarta-feira ao meio dia. Ele comentou abismado que a igreja estava cheia e nesse dia soltou a sua imaginação, que eu chamo de preencher lacunas  literatas. A imaginação flui e vamos criando amiguinhos que cabem na nossa mente e no "papel", se a gente despejar tudo que a cabeça imaginou. É um exercício fabuloso para se divertir. 

     Sabe, penso que todo mundo tem seus fantasminhas e que em algum momento da vida tentou preencher na mente as lacunas das informações de pessoas que viu uma vez na vida, imaginando como que poderia ter sido as vidas delas antes desse encontro.

      Mas amigo que é amigo reclama quando a gente não fala mais com ele, aí turma, meus fantasminhas começaram a reclamar.


   "Mas rapaz, você nos abandonou"; outro disse: "Sei que você não gosta de mim (Eu...), você sabe eu sou meio mala mesmo, compreendo o seu abandono" (Cá, comigo, eu disse: imagina ...). Teve uma, meio pedante, "Você tem me feito heroína, mas me deixou com aquela roupa cafona". Porém, sempre há na vida os nervosinhos. Este, todo abusado, me xingou e eu quase o peguei pela abertura da camisa, foi quando disse: "Que é isso camarada?" Ele respondeu: "Por que você me deixou levar uma surra daquela quenga?" Eu  nem quis dizer a ele: "Mas homem! É só uma história". Eu sei, ele não, mas bem que saiu da refrega todo machucado. Não esperava que a bonitona lutasse Krav Maga.

    Depois disso passei uma meia hora pensativo, até que saí do mutismo e disse a eles: "Me aguardem, na próxima semana nós vamos conversar muito. Tá bom assim amigos?" Alguns ficaram sério, outros sorriram, o único que falou foi o abusado: "Vê se não me faz levar outra surra daquela. Ainda me dói tudo". Eu sorri para ele e disse: "Foi só aquela vez, mas é bom para você não se achar macho demais." Foi a vez do escritor moralista e tomei o troco: "Você deveria só conta a história, sem juízo de valor." Sabe, pensei, é melhor não se meter com algum personagem, vai que arrumo uma briga feia e ele contamina os outros.


  Já que eu matei um pouco a saudade, vou me despedir. Até a semana que vem.


Abraço,






PS: Só lembrar de quais fantasminhas me refiro. Estão neste livro.

    Santinha ou Dora ou Tereza, é a bonitona; Marcos Vaqueiro,  foi o que levou a surra e Antonio Carlos, o mala, de marca.      

    
     
     

terça-feira, 17 de abril de 2018

Saudade na forma de fotografias

Quem não ouve a melodia acha maluco quem dança...... Frase de Oswaldo Montenegro.

    O mesmo ocorre com quem não sabe o que é ter amigos.


        Há muito tempo eu queria escrever inspirado nesta frase: "Saudade é o amor que fica" mas não encontrava o tom.
    
    Queria falar do como esta frase tocou em mim desde que li o post no Whatsapp, depois no Facebook, atribuído ao Dr. Rogério Brandão, médico oncologista que tratava uma menina, onde ela dizia o que entendia sobre a saudade.

    O contexto da narração é a de uma situação extrema, a proximidade da morte. Mas há muitos outros contextos nos quais a saudade vem nos abraçar. 

     Mas dia desses o amigo Thiago despejou a sua saudade na forma de fotografias e outros colegas foram se juntando e postando mais e mais fotografias da nossa trajetória na agência Agamenon Magalhães do Banco do Brasil. 

     Tiveram infelizes que tentaram estragar, mas ao final a amizade foi soberana. Lá, tivemos um ambiente onde a maioria se alegrava com a alegria do colega, onde a maioria se entristecia com a tristeza do "irmão" e corríamos para o apoiar, onde o happy hour da sexta-feira era a meta que não precisava de cobrança, era o plus que nos preservava do estresse e da doença.

      Estivemos felizes por longos anos, sem que o modo de ver o mundo do Banco do Brasil, baseado no sofrimento, nos atrapalhasse. Acho que isso motivou Thiago e ele nos motivou a se manifestar e mesmo, àqueles que não o fizeram, tenho a convicção que também sentiram saudade desse ambiente de camaradagem.

      Estamos agora dispersos, espalhados em várias agências, outro tanto, fora do Banco do Brasil, mas vale e como vale a frase: Saudade é o amor que fica. Pois bem, também sinto saudade. Eu já começava a me lamentar, a me resignar, a me entristecer, afinal, no fim tudo acaba na vida, mas não custa nada repetir Vinicius de Morais: "Que seja eterno enquanto dure" e, essa eternidade de uma vida é nós que fazemos.

     No entanto, de nada vale, se a saudade na forma de fotografias não se materializar. São algumas delas, das muitas que estão no grupo de Whatsapp BB Agamenon e Amigos BB.
   










      Vida longa e com saúde amigos, oxalá possamos sempre ter outras horas de encontro para colocarmos a prosa em dia e podermos ser um ouvinte atento, se apoiando na compreensão e não no julgamento. 

      Abraço, até a próxima.




Luiza Possi e Oswaldo Montenegro - "A Lista"

sexta-feira, 13 de abril de 2018

Réquiem para um defunto vivo


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    Na sexta-feira passada a Globo News ligou o full time para a iminente prisão de Lula no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, a cobertura me trouxe um sentimento de perda e de tristeza. Uma melancolia que provocou-me a reação de só ouvir as vozes das repórteres falando. Não quis ver as imagens, fiquei curvado e muito tempo de costas para a televisão apenas escutando as sucessivas repetições de informações.

    Foi uma "matéria jornalística" com ares de cobertura perfeita para satisfazer aos louvadores e aos detratores de Lula. Quase como uma tempestade perfeita, que a tudo destrói.

   A cobertura parecia um réquiem para um defunto vivo. Para mim era o enterro simbólico e um enterro real para muitos que colocaram seus rancores, recalques e todo tipo de afeto negativo em cima de Lula e, talvez, nem saibam a razão objetiva.

     O defunto.

    Um tipo de defunto que ao longo de quase quatro anos foi sendo cevado parcimoniosamente com pequenas doses diárias de ódio, como pílulas com aparência de placebo, sem gosto, com efeito lento para  depois desse longo tempo a alma, já totalmente tomada pelo ódio, se tornar facilmente permeável às manipulações de quem comanda a mente dos indivíduos.

    Mas agora as circunstâncias políticas, criadas há tempos,  exigiam esse defunto para acalmar a turba que se mostrava violenta.  Mas, matar literalmente era um risco muito grande que os estrategistas não queriam correr. Em situações semelhantes, o melhor é sangrar aos poucos para que o defunto vivo suma dos corações dos que o odeiam e dos corações dos que o amam.

      Fiquei mais de hora ouvindo as repetições das repórteres da Globo News, sentindo que queriam uma declaração bombástica, uma nova oportunidade para repetir aos quatros ventos um escorregão, mas não houve. Estranhamente, surpreendentemente ou com sabedoria os discursos não foram incendiários. A violência dos militantes, foi um dano único, pequeno, diante do potencial de confusão existente.  Nada de maior significância. Até as pancadas que alguns jornalistas levaram foram desidratadas pela mídia porque levaria a um aprofundamento indesejado da sua causa. Quem faz a história é quem a conta, então ...

       Na última semana as inserções ao vivo da cobertura televisiva se repetem, vazias de conteúdo, repletas de sentindo. Dois signos estão presentes: "Olhe, seu líder está preso; olhe, seu ódio já pode ser aplacado, seu inimigo está preso."

      No entanto, bem mais significativo é  o discurso de que ninguém está acima da lei, o que me levou a lembrar de uma história, que pode ser do folclore político de Pernambuco, não tenho certeza.

     Dizem que Agamenon Magalhães quando foi governador do estado e ao ser questionado por correligionário sobre uma ameaça eleitoral respondeu, parafraseando Maquiavel (*): "Para os amigos tudo. Para os inimigos os rigores da lei."

     Assim foram as coisas e as muitas lacunas destes pensamentos, para as quais não sou capaz de suprir, possam ser preenchidas com a reflexão de cada leitor.

     Quem sabe neste estilo,

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Abraço,

   

    

    

sexta-feira, 6 de abril de 2018

Seu lindo bom dia

        Adote o hábito de dizer algo amável ao pronunciar as primeiras palavras pela manhã. Isso estabelecerá sua disposição mental e emocional para todo o dia... Frase de Norman Vincent Peale.

    A vontade de falar sobre a política e suas nuances sem fim ainda me estimulava, mas a inspiração desta semana veio mesmo pela voz sintetizada do aplicativo do Uber e em vez da aridez de falar dos tantos conflitos de nossa realidade atual a voz saída do autofalante do celular me fez ir atrás de uma coisa simples, mas,  geralmente negligenciada. 

     Nesta quarta eu peguei um carro do Uber e o GPS estava conectado ao aplicativo do próprio APP, depois de cinco minutos a voz orienta o motorista, uma voz suave, quase musical, um pouco mais à frente me lembrei da voz metálica e em mono tom do Wize e do Google Maps. 

     Não de imediato, mas um tempo depois a voz de Iris Littieri chegou aos meus ouvidos vinda das minhas recordações. Ela é a dona da famosa voz dos aeroportos brasileiros dos anos 1990. Uma voz suave e lindamente pronunciada.

      São três vozes femininas, mas a quarta me encantou, uma voz belíssima e muito musical.

     Mas antes de falar dela, recordo vivamente de um senhozinho que às cinco horas da manhã caminhava no Parque da Jaqueira no contrafluxo dizendo para cada pessoa que o via: "Bom dia!" Quando não havia resposta ele replicava com um sorriso; "Ainda existe bom dia!", e continuava sua campanha solitária pela humanização do amanhecer naquele pequeno trecho do Recife. 

      Voltando para a voz do GPS do Uber: "Em 800 metros faça uma leve curva a direita na rua Fernandes Vieira" e tal voz me fez lembrar o que por anos, mais de vinte, reclamava uma crônica. 

    Hoje, 2018, a época: 1995. Neste ano cheguei em Barbosa Ferraz, lá no Paraná, na metade do mês de agosto. 

      Fui gerenciar a agência do Banco do Brasil. Lá o principal cliente da agência, fosse pelos negócios ou pela sua enorme influência, era a cooperativa COAMO, por causa disso tínhamos que manter contato com o entreposto dela na cidade praticamente todos os dias.

     Sempre que ligava, a telefonista, que eu supunha ser, atendia e me passava para o gerente do entreposto. Foram pelo menos três semanas  de contato por telefone, só umas poucas vezes conversei com ele pessoalmente na agência do BB.

    A resposta inicial nestas ligações era sempre: "Coamo, bom dia!", sem o padrão de dizer o próprio nome. Com o passar do tempo a sonoridade da voz e o timbre musical me encantou, quando ligava para lá gostava de ouvir: "Coaamo, boom diia! "


     Agora imagine de olhos fechados ouvir na  voz mais bela que você já ouviu na vida dizer um bom dia com essa musicalidade. 


     Imaginou?


    Bem, o tempo passou e eu necessitei conversar com o gerente Darci sobre a safra de verão a ser financiada, eram acordos sobre funcionamento daquele ano: pagamento direto, como agir com os clientes endividados (Qual divisão das receitas o Banco do Brasil e a COAMO fariam), negócios como a retribuição dela em aplicações financeiras, etc.

    Agendo a visita, que ocorreu em um dia de setembro e chego lá antes do horário, pela manhã.  Darci está resolvendo alguns negócios e atrasou alguns minutos, a mulher que me atendeu indicou uma cadeira e eu fiquei esperando. 

    Quando ele chegou, me chamou à sua mesa e começamos a conversar, em certo momento a jovem chega perto, diz algo para ele, eu escutei e não me interessei. A mesa de Darci ficava vizinha ao Caixa e a mulher também atuava como auxiliar à gerência.

    Conversa vai, acertos vêm, toca o telefone: "Coamo, bom dia!" Outra ligação: "Coamo, bom dia!" E a voz bonita, sonora e musical, seguiu me encantando, no entanto, a fantasia de sua dona ser tão bela quanto a sua voz quase estragou o fato de que ela embevecia quem ouvia seu lindo bom dia. 

    Abraço, bom dia!


      

      

O poder revela ou transforma uma pessoa?

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