sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Do Face ao Zap: A subjetividade sequestrada

  Creia em si, mas não duvide sempre dos outros.... Frase de Machado de Assis.

"O homem é um animal político" 
significa que ele tem a contraparte mental 
das características físicas de um animal da horda. 
(Wilfred R. Bion - psicanalista)

    Este não é um tema novo. A partir de 1997 estudos científicos foram realizados no Brasil para esmiuçar como as empresas capturavam a subjetividade dos seus empregados. O caso agora é diferente e é muito mais abrangente por envolver a internet e milhões de pessoas. 

     Fomos todos cobaias de um experimento que deu certo dentro do Facebook. 

    Alguns anos atrás eu comecei a estudar o livro "O poder das organizações" ( Max Pagès).  Neste livro há uma série de análises de aplicações  de técnicas, feitas por uma empresa norte americana nos anos 1.980, para dominar a subjetividade dos seus empregados sob uma ampla denominação de Domínio Ideológico. Há até particularidades nelas como a Nova Igreja, onde se criam vínculos a partir de eventos assemelhados aos cultos de uma religião.  Trabalha-se o mito da onisciência, a perfeição em forma de organização,  que tudo supre e é perfeita.

     No final, o resultado é que a subjetividade do funcionário está dominada a tal ponto que toda criticidade do pensamento some. Nenhum contraditório é admitido, pois a subjetividade dominada expulsa o contraditor.

    Agora imagine: eu, você, e nossos amigos envolvidos nas  redes sociais e agora no Whatsapp, formando uma massa gigantesca, dando likes e não likes adoidado, recebendo enxurradas de Whatsapps. Comentando e apoiando e repassando (sem dó) o que acha de valor,  criticando e negando o que não gosta.

     O tempo passa, sem notar só chegam postagens que se adequam às respostas que desejamos  e as crenças que professamos.  Também sem notar, o pensamento começa a ser doutrinado, direcionado para obedecer aos interesses do emissor. 

Nenhum contraditório é admitido, a subjetividade dominada expulsa o contraditor.

    Sem nos dizer, vão nos fazendo mudar a forma de ver o mundo para mundo que querem que vejamos, não nos deixando perceber as contradições das mensagens.

   Sem que se perceba se iniciam as transmissões ao vivo.  Cada um fica ansioso, carente da divindade, pelas suas "sábias palavras a indicar o caminho da redenção". A crença domina a lógica e até a contraprova do método científico passa a ser fake.

   Nenhum contraditório é admitido, o contraditor existente dentro de nós está morto. Toda opiniao se volta contra o que "pensamos", "acreditamos", a confiança é suprema nas mensagens e a "raiva" ganha destaque quando um outro pensamento se opõe "à minha crença".

    A partir desse ponto só importa o sensorial.

   A negação é absoluta.

   Não valem outras proposições, não valem tentativas para pensar em algo diferente. Nem a sensatez própria de cada um vale algo.

     Tudo é rechaçado.

     A subjetividade foi sequestrada.
  
     Abraço, Marconi Urquiza.


Citação inicial:
Bion, W. R. (2007). O místico e o grupo [Attention and interpretation]. In W. R. Bion. Atenção e interpretação (pp. 73-81). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1970).




   

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Se achando deuses, ávidos para destruir

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  Estava iniciando a conversa com um amigo e ele já perguntou se estava adivinhando sobre morte nesta campanha presidencial. Se referia ao assassinato, na Bahia, do músico e capoeirista, Moa do Katendê, após uma discussão sobre o resultado do primeiro turno, onde o morto defendia as teses do Partido dos Trabalhadores e o assassino as teses do candidato do Partido Social Liberal. A sua indagação se deveu a minha crônica: Só faltava um defunto, escrita há quase duas semanas. A minha resposta foi de que eu estava observando uma crescente  tendência de haver mais violência por causa da condução da campanha neste ano. 

  Há muitas pessoas que estão se sentindo empoderadas pela lado ruim, liberados de qualquer temor de punição, sem ligar para a lei, sem ligar para a sociedade, para nada, apenas para sua própria maldade. Destravou qualquer princípio moral que pudesse estar bloqueando a violência nos agressores. Não existe mais o motivo de autodefesa. É punir e punir, punir e punir quem seja minimamente discordante. Foi-se embora por um bom tempo a aceitação da pluralidade, da diversidade. 

   Esta liberação, incitada por um discurso político radical, agressivo e que apaixonou brasileiros demais. Vou repetir, apaixonou, jogou a razão pelo ralo sem um cordão por onde ela pudesse ser puxada.

  Políticos ao longo da história fizeram isto. Armênios foram diziminados na Turquia no início do Século XX, os judeus, nem preciso falar, os curdos iraquianos durante a ditadura de Saddam Hussein. Os Tútsis foram mortos aos montes pelo Hutus em Ruanda, 800 mil pessoas mortas de todos os jeitos, facões, tiro, estrangulamento. 

   Vi uma entrevista de um homem Hutu na qual ele disse uma coisa mais ou menos assim. Antes do genocídio nunca havia feito nada de violento, mas no meio da barbárie saiu matando, perguntado se havia algum motivo, a resposta foi nestes termos: senti um ódio imenso por aquelas pessoas. A outra pergunta: muito foram seus vizinhos. Tiveram problemas com eles? Não, eles eram Tútsis e os Hutus estavam matando, eu sou Hutu. O contexto transformando boas pessoas em más.

   A barbárie no Brasil está empoderada nesta campanha eleitoral, até parece que todos que não estão com ele formam uma etnia como os Tútsis. O líder que instiga tais comportamentos não tem controle sobre seus apoiadores  e ao responder sobre o assassinato de Moa do Katendê quase que eu ouvia um: "Que é que eu tenho haver com isso." Pilates? 

   Eu tenho duas vivências que podem ilustrar o destravamento moral. Em uma delas houve a mudança de religião, em outra ocorreu a mudança de um gestor de uma empresa, grande, cheia de regras, normas de conduta, de ética, compliance, regras externas, legislação a dá na canela.

  Em tese, qualquer religião deve ter preceitos morais que tendem a levar os fieis a terem condutas morais superiores, respeito ao próximo, respeito a sociedade, tolerância à diversidade sexual e racial, apoio a drogados na sua recuperação, união das famílias, respeito as autoridades em geral. Todas pregam o temor doutrinário a Deus como forma de manterem as "bestas" interiores de cada pessoa dominada.

   Minha exemplificação se deveu ao convívio de nove anos com uma funcionária da nossa família. Em 1988 ela mudou de religião. De imediato observamos um fervor religioso que ela não tinha. Contentes vimos a vaidade pessoal mudar, passou a andar arrumada, se enturmou com as colegas de igreja, até a sua conduta mudar conosco. Alguns meses depois da conversão à nova religião começaram os problemas, algumas pequenas perdas, deixou de cumprir a sua responsabilidade diária com zelo, começou provocar perdas de alimentos por negligência, ora cozinhava demais, ora não armazenava no refrigerador, entre outros problemas. Era como se suas falhas fossem a cada evento religioso perdoadas. Ela viveu nesta religião por uns seis anos, até que se enamorou de um rapaz e a igreja condenou esse namoro, ela saiu da religião e recuperou seu comportamento anterior. 

    Exemplo simplista, concordo. 

   No entanto, quando uma influência ganhas ares de "certeza absoluta" o bom senso deixa de ser exercido, só a nova certeza é que conta e se o temor à lei, ao Estado não existem, acabou-se os freios institucionais. Ter aprovação dos seus pares se torna mais importante que respeitar a lei e a ordem, a barbárie tende a virar regra.

   Vamos para o segundo exemplo.

 Eu trabalhei nessa empresa muito tempo. Certo dia recebemos um novo gerente, técnico, de extrema habilidade interpessoal, organizado como nenhum outro com quem trabalhei e, principalmente, um líder absoluto. Vou repetir, um líder absoluto. Não encontrei em mais de 33 anos de trabalho um líder como ele. A liderança tornou fácil o trabalho, o desempenho e os resultados. Como se dizia à época: tudo de bom. 

   Feita esta pequena contextualização, vou trazer outra. A empresa atua em um ramo negócios dos mais regulados em qualquer nação, mesmo nos Estados Unidos. Leis, um "moi", regulamentos estatais, uma montanha, regras internacionais, rigorosas, compliance, vigilância de condutas on-line. Finalmente, regras e mais regras pela higidez dos negócios. Ponto final? Não. 

  Dentre os vários funcionários, havia um, bem exigente no cumprimento das regras. Certo dia eu notei que ele havia deixando de cumprir uma das regras mais fundamentais em um cadastro de um negócio, a fidelidade à informação cadastral da renda. 

  Pois bem, mediante o discurso que a organização era conservadora essa liderança começou a liberar os freios institucionais, os funcionários começaram a agir burlando as regras para o "bem" dos resultados (Colocando seu trabalho em risco para atender ao seu líder). No final da sua passagem os resultados ruins começaram a aparecer, mas agora havia um novo gestor que herdou e, "Toma que o filho é teu."

  Comentamos acima esses dois cosmos, um bem pequeno e o outro enorme. Neste, o esforço de controle da organização é imenso, pois luta com dois aspectos, a sua cultura, que estimula a quebra das regras na busca de se atingir os números de qualquer modo e o seu gigantismo.

  Agora, imagine a situação do Brasil hoje. Com sua imensidão e com essa violência que dá ares de epidemia, estimulada desde muito, ultra estimulada neste ano, com milhões de apoiadores cegos para outras considerações, se achando gladiadores e ávidos para destruir, "querendo agradar seu deus".

   Suspeito que é o início do medo de uma nação.
  
   Abraço, Marconi Urquiza



PS: 
Para uma leitura futura, o contexto desta crônica é a eleição presidencial no Brasil de 2018.











    

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Crônica de Machado de Assis sobre a primeira eleição direta para presidente no Brasil.

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Quando eu cheguei à seção onde tinha de votar, achei três mesários e cinco eleitores. Os eleitores falavam do tempo. Contavam os maiores verões que temos tido; um deles opinava que o verão, em si mesmo não era mau, mas que as febres é que o tornavam detestável. A quanto não ia a amarela? Chegaram mais três eleitores, depois um, depois sete, que, pelo ar, pareciam da mesma casa. Os minutos iam com aquele vagar do costume quando a gente está com pressa. Mais três eleitores. Nove horas e meia. Os conhecidos faziam roda. Uns falavam mal dos gelados, outros tratavam do câmbio. Um velho, ainda maduro, aventou uma boceta¹ de rapé. Foi uma alegria universal. Com que, ainda tomava rapé? No meu tempo, disse o velho sorrindo, era o melhor laço de sociabilidade; agora todos fumam, e o charuto é egoísta.

Nove e três quartos. Trinta e cinco eleitores. Alguns almoçados. Os almoçados interpretavam o regulamento eleitoral diferentemente dos que o não eram. Daí algumas conversações particulares à meia voz, dizendo uns que a chamada devia começar às dez horas em ponto, outros que antes.

— Meus senhores, vai começar a chamada — disse o presidente da mesa.

Eram dez horas menos um minuto. Havia quarenta e sete eleitores. Abriram-se as urnas, que foram mostradas aos eleitores, a fim de que eles vissem que não havia nada dentro. Os cinco mesários já estavam sentados, com os livros, papéis e penas. O presidente fez esta advertência:

— Previno aos senhores eleitores que as cédulas que contiverem nomes riscados e substituídos não serão apuradas; é disposição da lei nova.

Quis protestar contra a lei nova. Pareceu-me (e ainda me parece) opressiva da liberdade eleitoral. Pois eu escolho um nome, para presidente da República, suponhamos; ou senador, ou deputado que seja; em caminho, ao descer do bonde, acho que o nome não é tão bom como o outro, e não posso entrar numa loja, abrir a cédula e trocar o voto? Não posso também ceder a um amigo que me diga que a nossa amizade crescerá se eu preferir o Bernardo ao Bernardino? Que é então liberdade? É o verso do poeta: “e o que escrevo uma vez nunca mais borro”? Pelo amor de Deus! Tal liberdade é puro despotismo², e o mais absurdo dos despotismos, porque faz de mim mesmo o déspota. Obriga-me a não votar, ou a votar às dez e meia em pessoa que, pouco depois das dez, já me parecia insuficiente. Não é que eu tivesse de alterar as minhas cédulas; mas defendo um princípio.

Tinha começado a chamada e prosseguia lentamente para não dar lugar a reclamações. Nove décimos dos eleitores não respondiam por isto ou por aquilo.

— Antônio José Pereira — chamava o mesário.

— Está na Europa — dizia um eleitor, explicando o silêncio.

— Pôncio Pilatos!

— Morreu, senhor; está no Credo.

Um eleitor, brasileiro naturalizado, francês de nascimento, disse-me ao ouvido:

— Por que não se põe aqui a lei francesa? Na França, para cada eleição há diplomas novos com o dia da eleição marcado, de maneira que só serve para esse. Se fizéssemos isto, não chamaríamos o senhor Pereira, que desde 1889 vive em Paris, 28 bis, rua Breda, nem o procurador da Judeia, pela razão de que eles não teriam vindo tirar o diploma, oito dias antes. Compreendeis?

— Compreendi; mas há também abstenções.

— Não haveria abstenção de votos. Os abstencionistas não teriam diplomas.

A chamada ia coxeando. Cada nome, como de regra, era repetido, com certo intervalo, e eu estava três quarteirões adiante. Queixei-me disto ao ex-francês, que me disse:

— Mas, senhor, também este método de chamar pelos nomes é desusado.

— Como é então? Chama-se pelas cores? Pelas alturas? Pelos números das casas?

— Não, senhor; abre-se o escrutínio por certo número de horas; os eleitores vão chegando, votando e saindo.

— Sério?

— Sério.

— Não creio que nos Estados Unidos da América...

Outro eleitor, brasileiro naturalizado, norte-americano de nascimento, acudiu logo que lá era a mesma coisa.

— A mesma coisa, senhor. Não se esqueça que o time is money é invenção nossa. Não seríamos nós que iríamos perder uma infinidade de tempo a ouvir nomes. O eleitor entra, vota, retira-se e vai comprar uma casa, ou vendê-la. Às vezes mais, vai casar-se.

— Sem querer saber do resultado da eleição?

— Perdão, o resultado há de ser-lhe dito em altos brados na rua, ou em grandes cartazes levados por homens pagos para isso. Já tem acontecido a um noivo estar dizendo à noiva que a ama, que a adora, e ser interrompido por um pregoeiro que anuncia a eleição do presidente da República. O noivo, que viveu dois meses em meetings³, bradando contra os republicanos, se é democrata, ou contra os democratas, se é republicano, solta um hurrah cordial, e repete que a ama, que a adora...

— Padre Diogo Antônio Feijó! — prosseguia o mesário.

Pausa.

— Padre Diogo Antônio Feijó!

Pausa.

Eu gemia em silêncio. Consultei o relógio; faltavam sete minutos para as onze, e ainda não começara o meu quarteirão. Quis espairecer, levantei-me, fui até a porta, onde achei dois eleitores, fumando e falando de moças bonitas. Conhecia-os; eram do meu quarteirão. Um era o farmacêutico Xisto, outro um jovem médico, formado há um ano, o doutor Zózimo. “Feliz idade!”, pensei comigo; as moças fazem passar o tempo; e daí talvez já tenham almoçado...

Enfim, começou o meu quarteirão; respirei, mas respirei cedo, porque a lista era quase toda composta de abstencionistas, e os nomes dos ausentes ou mortos gastam mais tempo, pela necessidade de esperar que os donos apareçam. Outra demora: cinco eleitores fizeram a toilette das cédulas à boca da urna, quero dizer que ali mesmo é que as fecharam, passando a cola pela língua, alisando o papel com vagar, com amor, quase que por pirraça. Para quem guarda Deus as paralisias repentinas? As congestões cerebrais? As simples cólicas? Não me pareciam homens que pusessem os princípios acima de uma pontada aguda. Mas Deus é grande! Chegou a minha vez. Votei e corri a almoçar. Relevem a vulgaridade da ação. Tartufo 4 , neste ponto, emendaria o seu próprio autor:

“Ah ! Pour être électeur, je n’en suis pas moins homme [Ah! Um eleitor, mas nem por isso menos homem].”

Fonte: Agência Senado

Glossário:
1) Boceta: Caixa de rapé.
2) Despotismo: Forma de governo que se funda no uso arbitrário do poder.
3) Meetings: reuniões, comícios.
4) Tartufo: Pessoa hipócrita.


sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Só faltava um defunto.


Foi preciso esperar até o começo do século XX para se presenciar um espectáculo incrível: o da peculiarísssima brutalidade e agressiva estupidez com que se comp... Frase de José Ortega y Gasset.



1 Conheci o filósofo espanhol Ortega y Gasset por acaso, quando um presidente de sindicato utilizou uma das suas frases mais famosas ao iniciar uma assembleia: " O homem é o homem e suas circunstâncias", só não disse a autoria. A frase me tocou tanto que meses depois não a havia esquecido. Era necessário ler o autor, felizmente um filósofo de fácil leitura e aí dei de cara com a versão escrita no livro: "Eu sou eu e minhas circunstâncias, se não salvo a ela, não me salvo a mim." 

2 Nesta semana eu estava tentando diagramar um poema para a crônica Minha Utopia, perdi a paciência e abandonei a ideia, foi quando surgiu, quase pronta esta crônica. Uma narrativa longa em um texto curto, a história dando o seu testemunho e fui atrás de Ortega y Gasset para me ajudar nesta tarefa.

3 Essa história começou bem longe, longe no tempo. 1911. Naquele ano uma violenta eleição saiu de Recife e chegou em Bom Conselho. Foi a briga entre os Dantas Barreto contra os Rosa e Silva e a bala forrou o solo pedregoso da cidade.

Um rancor eterno se instalou no espirito do povo, mas hoje sei que é muito mais que isso, pois aqueles lá de antigamente já se foram todos e esse rancor foi se renovando a cada geração, a cada eleição. Só que eu nunca entendi, o caso esteve acima da capacidade de compreensão até bem pouco tempo.

Cansei de me perguntar, Por que? Por que eram amigos, conversavam, bebiam juntos e no tempo de uma eleição se tornavam inimigos? E não eram poucos.

Em 1968, em plena ditadura militar no Brasil, eu presenciei o primeiro arranca rabo de fazer jus a uma briga fratricida. O coronel Zé Abílio ainda estava vivo, a sua habilidade de liderar fez conviverem perfis tão diferentes quanto os povos que formaram a Iugoslávia. Mas teve um custo, a semente do rancor virou uma pequena árvore agourenta.

Lembro que em primeiro de janeiro de 1969 todo o grupo político do Coronel Zé Abílio saiu da casa do prefeito eleito, Manoel Luna, foi visitar a  casa do adversário derrotado em uma tentativa de apaziguar os ânimos. Mas aquela plantinha estava vicejando.  

8 A eleição de 1968 foi tão crítica, tiveram tantos conflitos que as lideranças se reuniram e decidiram escolher um candidato único em 1972. Uma frustrada tentativa para pacificar a cidade, pois o resultado foi a ascensão de um homem truculento, belicoso, um coronel no espírito vicejante da República Velha. Aquela arvorezinha de 1968 já era uma árvore crescida, bem no meio da praça, sem que ninguém se desse conta que ela estava lá. Ela estava lá, sempre agourenta.

9 Chegou 1976, minha percepção dos conflitos daquela eleição eram difusos, meu pai esteve enterrado nela até o pescoço. Hoje me parece que o grupo político, novamente com a liderança de Manoel Luna, queria lavar a alma pela escolha errada de 1972, era fundamental derrotar o prefeito e seu indicado. Bem, mas, aí a peleja saiu da quase violência para uma violência real, explícita. Só faltou o defunto. Eleição ganha pelo grupo de Manoel Luna, mas o ambiente ficou em eterno suspense. A árvore era agora adulta, viva e incapaz de oferecer uma sombra.

10 Sabe, a violência regada desde 1911, regada em pequenas doses, foi criando um valor para aquela comunidade. Valia mais a truculência que o diálogo, o rancor imanente virou um ódio difuso e escancarado. Bem, eleição de 1982 e o defunto que faltava chegou, chegou com o meu pai, chegou na figura de um pistoleiro, chegou depois que as urnas se fecharam na figura de cidadãos comuns, chegou, finalmente, na figura de um agente público. O Estado agiu, encerrando os desmandos.

11 Li outro dia que o marco de ódio que corre envenenando os brasileiros se iniciou em 2014, foi não, o seu maior incentivo ocorreu bem antes. É uma construção histórica. Pode escrever, desde as primeiras eleições da República. Mas puxando para uma situação bem mais recente, trinta anos, desde que na disputa pela presidência da República se enfrentaram candidatos, um apoiado pela elite brasileira, de qualquer estirpe, e o outro, um candidato sem pedigree.

12 Lembram daquela árvore agourenta que falei no início, ela é agora uma gigante que sombreia com seus galhos secos, mais agourenta que nunca, os nossos dias.

Abraço,

Marconi Urquiza



sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Narrativas em conflito. O caso da CASSI.

     O que ofensiva do Banco do Brasil pelo SIM  na CASSI comunica?

  Acompanho com assiduidade as manifestações das pessoas e obtive algumas impressões acerca de alguns componentes dele.

   A primeira percepção e não é uma percepção que surgiu nas primeiras letras. Essa percepção me diz que no grupo há pessoas fazendo sondagem para avaliar a receptividade do SIM para a aprovação da proposta de alteração do estatuto da CASSI e deve haver muitas outras pessoas sondando os humores dos associados em outros grupos.

  Noutro grupo percebi a exclusão de quem faz oposição ao SIM e é francamente a favor do NÃO. É a estratégia para passar a impressão que o sim é majoritário.

   Na semana passada quando ouvi a notícia que haveria sucesaivas reuniões para mudar o voto do NÃO para o SIM ou capturar os votos doa indecisos eu me pus a analisar. 

    Então deduzi: 

  O NÃO é uma probabilidade real. Se tal perspectiva fosse remota os aposentados continuariam sendo apenas ex-empregados. Um número que não existiria mais para as estatísticas do Banco do Brasil, exceto na CASSI.
  
    A outra percepção. Ainda que não tenha tanta comunicação com os colegas da ativa, deles só obtive flashes de opiniões e principalmente o silêncio acerca da alteração estatutária da CASSI. O NÃO deve estar rodando a estratégia de rolo compressor do BB.

   Por experiência e por diálogo a gente sabe que a comunicação interna do Banco do Brasil é um monólito psicológico e alienante. 

     Mais uma dedução:

   As alterações provocadas pela diretoria do Banco do Brasil desde 2016, agindo como um exército predador contra um inimigo desarmado, provocaram uma enorme desconfiança nos funcionários da ativa.  Bastaria eles para aprovar a alteração estatutária. O NÃO indica uma reação a truculência do BB.

     

    Se estão atrás dos aposentados, tal ação pode ser decorrente  da rachadura do monólito da influência do BB sobre seus funcionários.  Viva o Whatsapp!

     Terceiro ponto:



   É que toda ação do Governo Temer foi para o Mercado, essa abstrata entidade e marcadamente Egoísta.  A norma CGPAR 23 é bem encomendada para servir ao propósito de facilitar a entrada das empresas de saúde de mercado na assistência à saúde do Executivo Federal.

    Aqui nem é mais desconfiança, há certeza que o prejuízo virá para os trabalhadores.

      Quarto aspecto:

 A falta de confiança nos representantes eleitos pelos funcionários em 2018.

    Eu votei e muitos votaram na chapa que foi eleita para a CASSI.  O Grupo MAIS se apresentou como defensor da Perenidade da CASSI e Defensor dos interesses dos funcionários.

    Mas o que vimos, A PROPOSTA CASSI não garante a Perenidade dela e o Grupo Mais não defende os interesses dos funcionários e eles foram os principais interlocutores do SIM, agora o BB  colocou a sua estrutura para derrotar o NÃO.

    
    E agora?

     

  Precisamos ter em mente que acompanhar e auditar a votação dessa alteração estatutária é garantir a fidelidade dos votos, seja para o SIM, seja para o NÃO.


Abraço,

Marconi Urquiza 

      

     

   

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Fedor sem fim

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     Pense no sofrimento, meses a fio com aquele fedor sem saber a origem e eu a exigir limpeza constante, cutucando todos os cantinhos da casa, procurando o odor nos sapatos, nos guarda-roupas, nos armários da cozinha. Para evitar a pestilência até empurrei o lixeiro para bem distante, para os confins do quintal e, nada. Nós nunca achamos a fonte do mal-cheiro. 

    O tempo passou e o fedor amenizou, já não se sentia tão forte, mas estava por lá. Se fosse uma pessoa, era um ser renitente.

   Mas, com um nariz tão teimoso quanto o fedor, eu quase toda vez dizia: tá fedendo e, tome limpeza, passado o efeito do perfume, a pestilência chegava teimosa.

   Certo dia, na hora do almoço, eu disse para minha esposa: "Vamos fechar as saídas dos ralos dos banheiros, esses sifões estão estragados!" Obra feita, tudo pareceu se acabar, mas pense! Não funcionou. Nos resignamos, o negócio foi conviver com o fedor.

   Já fazia um ano que a pestilência havia surgido. 

   Depois desse ano Paulina foi trabalhar conosco, o tempo passou, eu até que tentei me acostumar com aquele fedor. Só que, um dia eu cheguei em casa e de passagem pelo quarto dos meninos reclamei:  "Esse fedor de novo!". 

  Paciente, ela chegou, deu aquela fungadinha básica e sentenciou: "Isso é fedor do pau de bosta". 

  "Eita, e existe isso?", qual foi a minha surpresa. Aí pus as ventas para trabalhar, corri em direção as camas, retirei os colchões, dei também uma fungada, só que bruta,  e quase gritei: "É aqui de onde vem esse cheiro de merda!" 

   Irritado eu pensei em todos os xingamentos que a minha memória guardou. Foi aí que fui me lembrar que em Barbosa Ferraz eu havia contratado um marceneiro para fazer os três estrados das camas de solteiro, paguei caro por uma madeira que fosse forte, só que ela era mais fraca que seu fedor sem fim.

Abraço,
Marconi Urquiza

https://www.reclameaqui.com.br/probel/box-com-madeira-pau-bosta_4y9futPp511kIfLu/
          

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Abraço sombreado.

e um vaga-lume
lanterneiro que riscou
um psiu de luz... Frase de Guimarães Rosa.



   Em um desses sábados eu corria preguiçoso no carro para ir a um trabalho freelance quando passei na esquina da praça do Derby (*) indo para Boa Viagem e vi uma sucessão de imagens que passam despercebidas no cotidiano, tais imagens me chamaram a atenção e ativou uma busca frenética por outras tantas arquivadas nas minhas lembranças. 

  Nesse trecho da Avenida Agamenon Magalhães (*) há muitas árvores. Naquela hora, perto das oito da manhã, eu comecei a olhar as sombras se alongando na direção do Hospital Português, cruzando a avenida perpendicularmente e mansamente se espraiando no horizonte.

  Passei por elas, segui para os conjuntos de viadutos da Joana Bezerra e outras imagens foram se formando, foi quando percebi:



  Cada árvore se desenhando no solo, Cada uma maior que o seu tamanho natural, Cada uma se multiplicando e Cada uma acolhendo quem cruzava o seu sombrear com um abraço fraternal.


Vai para você meu abraço 

Marconi Urquiza 



(*) Praça e avenida de Recife.

O poder revela ou transforma uma pessoa?

  imagem: Orlando/UOL.            Um papo na última segunda-feira entre aposentados do Banco do Brasil que tiveram poder concedido pela empr...