Ando tão sem assunto, que chego na vésperas das sextas-feiras com a mente vazia e isto já tem vários meses. Algumas vezes me dá vontade de falar do processo de escrita e paro. Penso todas às vezes: É um assunto que interessa a tão poucos e desisto.
Em 2003 eu ensaiava querer aprender mais coisas sobre como criar um personagem e me convidei para conversar com Dr. José Nivaldo, médico e escritor, que vivia em Surubim. Ele bom de papo, falou um monte e em certo momento eu perguntei:
- Doutor, eu tenho uma curiosidade. Como é criar um personagem?
Silêncio, ele ignorou completamente pergunta. Tornei a fazê-la, silêncio, então parei. Diz um dos maiores professores de escrita criativa, Assis Brasil, que um livro deve começar pelo personagem central.
Quando rascunhei o primeiro romance eu não pensei nisso, queria apenas contar uma história. Foi isso que fiz. Naquela época ainda não tinha desenvolvido o sentimento, que ao se fazer um texto grande, eu estava como se tivesse construindo uma casa. Isto só ocorreu quanto fiz o Trabalho de Conclusão do Curso de Direito. Meses de trabalho, e sim, foi muito difícil. Não com a profundidade da dissertação, mas tão complicado quanto ela.
Certo dia, já falei dele, ganhei um presente de um senhor, 70 anos na época, um angolano de pele branca, fugido da guerra da independência de Angola, em 1975. Ele me deu o livro: Angola - O último café. Que é uma narrativa da fuga da fuga de uma família no meio da guerra civil e do desejo de vingança contra os filhos de portugueses. Esse título me fez criar imediatamente outro, bem sonoro. Mas não tinha mais nada que uma ideia desconchavada.
Seguindo a cartilha, fui pesquisar. Li muitos livros. Por exemplo: Coronel, Coronéis, de Marco Antônio Vilaça. Li o livro: Coronelismo: Enxada e voto, de Victor Nunes Leal.
Interessante é o livro de Vilaça fala dos mais famosos coronéis de Pernambuco. Chico Heráclito, de Limoeiro, José Abílio, de Bom Conselho, Veremundo Soares, de Salgueiro e houve outro, que acho que era de Parnamirim. No livro de Leal, ele estudou os coronéis de Minas e São Paulo. Em resumo: Os barões do café e do gado. Os homens riquíssimos e com praticamente os mesmos modos de agir dos coronéis nordestinos.
Em síntese mal ajambrada: O poder é que guiava esses homens e fazia terem certos comportamentos semelhantes.
Continuei a pesquisar, tinha lido no jornal A Gazeta, de Bom Conselho (PE), um pequeno resumo de um trecho do livro A Revolução Pernambucana de 1911, do pesquisador João Alfredo dos Anjos. Cacei esse livro para tentar entender por que em Bom Conselho, em 1911, não houve eleição, motivado por uma briga na bala do coronel José Abílio, a favor de Dantas Barreto, e Lívio Machado Wanderley, que era a favor de Rosa e Silva. No popular, a bala correu solta.
Nessa pesquisa, achei uma autobiografia, um livro raríssimo, do coronel José Abílio: Um coronel do sertão. Li com gosto, nas lacunas eu imaginava o seu perfil, misturando com o que falou de si mesmo, com as histórias que ouvi dele na minha vida.
Um dia, no meio de uma depressão, comecei a escrever, pouco mais de 4 páginas e o coronel surgiu em um hipotético diálogo que tive com meu pai, na porta da farmácia, quando falei para ela da moça bonita que passava na outra calçada e na hora papai disse: Cuidado, ela é do coronel.
Aí foi surgindo um personagem, rico, cheio de nuances, cheio de manhas, contradições e de humanidade. Foi tanto, que ele extrapolou do romance, ainda inédito, A Puta Rainha para o outro, também a ser publicado: O Último Café do Coronel. Ambos já comentados em outras crônicas.
As ideias, não surgem apenas de uma clarão, ela surgem da reflexão, de certa prática de pensar e agir, de experimentar e tentar soluções para um problema. Não surgem do nada, sempre tem um pesinho em um somatório de pensamentos.
Um escritor, um cientista, um cantor, compositor, artesão. Todos aqueles que usam a capacidade de criar, podem até ter o dom, mas ele exercitam diariamente a vontade de criar algo, de ter uma solução, e por aí vai.
A inteligência, para mim, é mais que uma capacidade natural, ela é criação da pessoa, da sua insistência em melhorar.
Pois bem, como esse raciocínio, quem sabe, um dia, não saia: Coronel, Coronéis, o mesmo José.
Até a próxima.
Marconi Urquiza.