Três amigos adoeceram recentemente. Um deles vinha adoecendo há muito tempo, desde que aposentou.
Lembro de uma conversa com ele logo após aposentar, ouvi, em parte fui bom ouvinte, em outro momento veio a impaciência dos mal ouvintes.
Nem posso afirmar que controlei a impaciência, mas continuei a escuta-lo. Quando o monólogo deu brecha, eu sugeri: "amigo, escreva, escreva, escreva tudo". Pensava que ele escrevendo liberaria a sua angústia e ocuparia a mente, mais tarde substituíria os pensamentos por outros sadios. Ele vivia em uma depressão profunda.
Nem isto e nem outra tentativa ocorreu. Hoje ele está inconsciente após uma cirurgia no crânio.
Os outros dois, as ocorrências foram repentinas, em um dia estavam bem, no outro hospitalizados.
Esta vontade de escrever a respeito veio me perseguindo desde os últimos vinte dias e se tornou inadiável quando desejei Feliz Aniversário e recebi o agradecimento com a informação que um dos amigos estava hospitalizado.
Na quarta-feira é o encontro semanal com um grupo de amigos. O assunto, citando um dos amigos foi comentado e passei a passear pela memória.
Saí visitando os encontros com amigos e familiares doentes, foi uma viagem silenciosa enquanto ouvia os companheiros da mesa falando as suas loas. Até rimos dos casos engraçados. Mas a mente continuou o seu passeio e parou em um amigo que trabalhava na mesma agência que eu.
"- Soubesse que "Célio"* foi hospitalizado?
" - Não. O que houve?"
" - Teve um infarto".
Na hora pensei: um infarto para quem tem 40 anos é coisa grave.
Saiu do hospital e entrou em licença médica. Finda a licença encontrei-o na agência, ele trabalhava em um posto bancário.
" - E aí? Como está?
" - Estou bem."
" - Foi infarto?"
" - Foi estresse".
A conversa andou mais uns minutos e se encerrou. Mas "Célio" estava diferente, era mais comunicativo, ele ficou introspectivo. Meses nessa condição.
Essa imagem da sua introspecção tem servido como um ponto de observação e reflexão de quando as pessoas se encontram com grandes problemas em suas vidas.
Como o seu eu elabora tudo isso?
É isto que venho refletindo sobre estes amigos com doenças recentes. Não por curiosidade, mas por afeto, por desejo que superem a condição e lá na frente coloquem um sorriso no rosto, daqueles que os olhos brilham também.
É preciso compreender, se isto estiver fora da nossa capacidade, é respeitar. Deixar a pessoa no seu luto.
É fundamental dar apoio, mas a dor do luto pode vir como um remédio para a alma. Noutras ocasiões esse remédio não vale nada, mas é preciso respeitar o momento de cada um.
Este é o desafio:
Esta crônica estava pronta desta a semana passada e não tive coragem de publica-la, se não fosse o encontro dos amigos com Loyola na nesta quarta-feira, ela ficaria para arquivo. Para arquivo.
Mas ela estava aqui, tendo uma frase que mostra a grande alma dele ao responder a um amigo da pelada. Calado eu prestação atenção ao redor e ouvi a sua resposta e ela veio assim, em tom de voz sereno, repetindo, sereno, eis: Para você ver a gravidade, estou fazendo quimioterapia. Mas o papo continuou, ele não mudou em nenhum momento o tom e nos fez felizes. Também serenamos. Serenamos. Ansiávamos para conversar com ele.
Ficamos muito alegres pelo encontro.
Vai um poema dos tempos que eu não dizia ao ver um amigo, a uma pessoa do meu apreço: Foi muito bom te ver, dizendo, cumprimentando e olhando nos olhos.
Vai o poema:
SÓ SAUDADE
amigo,
amigo sinto saudades,
nunca ligo,
não é por maldade,
tem descaso,
mas não é maldade,
é por saudade.
Amigo,
a saudade enternece,
quando cresce,
entristece,
acredite
no meu coração
na alma.
Se lugar é
muito grande.
Amigo,
não ligo, mas
ligo aqui dentro,
sei que não
advinhas.
Imagine, amigo!
Querer de
tão longe saibas
disso,
De longe e ainda
mais
se não ligo,
mas digo,
a saudade diminui
quase rui
quando estas palavras
vão para ti.
Só faltam chegar,
verdade,
verdade!
Amigo,
eu sou só saudade.
Araruna-PR, 26.08.2000.
Fiz como um pedido de desculpa a Ary Braz.
Abração, Marconi Urquiza
(*)
Célio - nome fictício.

