Ouvi na infância que devemos ser como vara de marmeleiro, que entorta mas não quebra.
Ouvi na infância que devemos ser como vara de marmeleiro, que entorta mas não quebra.
A PAZ DESEJADA
Algum
dia, em algum momento, France acordou com um sonho que dizia que seu pai
morreria. Foi forte, naquela manhã não se assustou.
Vivia
em um turbilhão no emprego novo, diferente do ambiente de camaradagem que
vivera até então.
Regras
escritas não faltavam, regras a ser aprendidas também não. Regras, as quais só
à custa de tempo, reflexão e experiência viriam a ser conhecidas.
Sentia
uma dificuldade enorme no novo emprego, em certo momento, depois de muitos
meses pensou em desistir. Era um sobrevivente e tentava sobreviver naquele
mundo novo, briguento e brigado.
Nada
do ambiente amigo que havia experimentado era presente nesse mundo novo, ela
pensava que um trabalho com base na amizade, cordialidade e diálogo produzia
mais. Estava se enganando. Os patrões
não queriam isso, trabalhavam para que a disputa entre seus empregados
produzissem riqueza para a empresa. Se alguém abusasse, fora. Se alguém se
tornasse inconveniente, fora. Se alguém se tornasse um arquivo vivo, virava
alvo. Se não destruíssem a sua alma, valia o físico. Zero de risco.
France,
depois de muito tempo se adaptou, tanto que que progrediu. No entanto, manteve
em sua alma aquela porção de ingenuidade: confiar nas pessoas.
Mas
essa confiança a traiu, quando viu que estava ferrada disse para si que era
preciso fazer alguma coisa: sobreviver.
Arrumou
as coisas e foi trabalhar em outro lugar. “Preciso olhar para frente. As coisas
lá de detrás já foram”. Isso foi se transformando em um mantra: olhar sempre
para frente.
Um
dia a chamaram. No meio da conversa uma frase parecendo solta foi dita. Ela
tocou na mente de France. Pensou em indagar, só pensou. Pensou e engoliu. Nesse
tempo a teimosia santa já fazia parte do seu kit para sobrevivência.
Se
alguém mais chegado a chamava de teimosa, ela dizia: “Não sou teimosa, sou
persistente”. Quando ouvia: “Mas como
persistente?” Ela se calava, não queria dar munição a ninguém.
Um
dia, sabe, um dia ela ouviu: “France, você tem que se reinventar”. Ela olhou
para a interlocutor e ficou pensando: “Ele não me conhece, nada sabe da minha
vida. Me reinvento há dez anos”.
Tais
reinvenções nada tinham a ver com a percepção daquele seu chefe. Tudo que tinha
feito era demonstrar que não estava obsoleta. Mas ela tinha um problema. Os
seus valores eram considerados arcaicos. A sua adesão aos valores novos era
seletiva. Travava quando achava que alguma atitude seria desonesta, mesmo
sacrificando algum ganho.
Certo
dia disseram que ela estava fora, France afundou. Ficou meses perdida nos seus
pensamentos. A sua ingenuidade a impediu de se defender. A raiva deu lugar para
a tristeza e lambeu a porta da depressão.
Depois
de muito tempo, ela disse: “Não posso ficar nessa tristeza mais três dias”.
Fez
uma escada no barranco e foi levantando degrau a degrau. Quando o buraco ficou
para trás, ela se encontrou com seu algoz. O impulso fez ela querer agredi-lo,
foi salvo por que aquele homem percebeu o perigo e saiu sorrateiramente.
“Ele
tem costas largas, eu tenho raiva”. Pensou em se vingar. Era preciso mostrar o seu
valor. Planejou tudo. Tudo.
Um
tempo depois ela se sentou no sofá da sua casa. Estava agitada, agradecendo a
Deus não ter agredido a quem achava que sido o ordenador da sua desgraça.
O
seu viver, a duras penas estava se reorganizando. Lutava com poucos recursos,
usava toda a sua inteligência e os seus conhecimentos para tocar a nova vida.
Aos
poucos o ódio foi sendo domado, aos poucos France foi percebendo a sua força. A
sede de vingança foi sendo controlada, até que um dia se encontrou com seu
desafeto. Olhou para ele, fez questão de cumprimentar, desejou dizer toda a
raiva que sentiu, apenas disse: Bom dia.
Selou
para o seu coração a paz desejada.
31/01/2021
– 15:32h
Que bode desgramado,
Fazia tempo que eu esperava por uma segunda-feira, onze de janeiro. 11 do 01. 11-01. Hoje é uma segunda 11 de janeiro. Ter visto Dona Duda, aos 84 anos, nestes dias desencadeou estas lembranças. Dona Duda era dona do restaurante onde fazíamos a refeição em Afogados da Ingazeira.
39 anos antes eu entrava, pela porta dos funcionários de antes do expediente, no Banco do Brasil de Afogados da Ingazeira, era um pouco antes das sete horas da manhã. Como um visitante ilustre eu era esperado, não por fama, mas por eu ser o último do concurso de 1981 ou quase, a tomar posse naquela agência.
Ao entrar um vigilante me recebeu, uma colega que não lembro o nome me indicou a mesa de Ronald Teixeira Cavalcante, gerente-adjunto, ainda de pé, ele me deu a carteirinha funcional e vaticinou: Decore este número, ele nunca mais vai sair de sua vida. Não saiu.
Naquele mesmo dia eu recebia o primeiro talão do Cheque-Ouro, o mais potente Iphone dos produtos bancários daquela época, capaz das maiores distinções sociais. Dever o limite foi um visgo que levei cinco anos para me livrar.
Naquele dia começou uma história, a da minha vida, que me permitiu ter um rumo, em muitos momentos uma causa para viver, um sentido para a vida, agregando valores que ainda hoje me movem, como ética, respeito pelo próximo, tratar o cliente com atenção e consideração (sob qualquer circunstância). A realidade mudou, o discurso de engrandecimento melhorou e a prática destes bons valores pioraram.
Os melhores anos, pós 1996, foi quando como gerente eu me sentia especial, inventava coisas sadias para dar bons e sustentáveis resultados. Salvar o BB da falência ou da privatização era um sentindo de vida importante. Ter resultado virou o maior mantra, independente das práticas. Minha doce ilusão foi mudando. De 2002 em diante, era preciso se adaptar ao novo modelo, era preciso se reinventar, eu de tantas reinvenções me sentia agoniado, sem saber como me provocar constantemente tantas invenções. Mas eu não enxergava, as reinvenções estava no patamar do espirito, eu não sabia como agir, quebrando ou abandonando os meus valores (honestidade de princípio, atitudes éticas, vendas reais e por aí foi). Não quebrei e me quebrei.
Dia desses eu estava me lembrando da Ação do Fome Zero, aquilo correu o Brasil de cima a baixo. Lembro que em 1998 nos fizemos em Terra Boa (PR), quando as crianças começaram a chegar em um evento dos dias das crianças eu cunhei um termo que nunca esqueci: Fome escondida. Ali a fome era escondida, não escancarada como ocorria no Nordeste daquela época.
Teve um momento que minha esposa idealizou um São João, ela reuniu as crianças dos colegas, conseguiu carroças de burro, um lojista que tocava sanfona e forró se dispôs e correram a avenida Brasil em Terra Boa levando a bandeira do BB. Este e vários outros episódios foram feitos para tornar a imagem do BB simpáticas nas cidades. Nessa época a imagem do BB era um torrão de madeira, queimadinha, bem queimadinha e eu era um dos artífices do novo Banco do Brasil. Eu me sentia especial.
Deixando as mágoas de lado, há toda uma história rica dentro da empresa, das pessoas que conheci, dos amigos que conquistei, do respeito dos clientes que obtive, das histórias divertidas que ouvi e que presenciei, das lições que aprendi. Dos risos que dei e alguns que provoquei. Do assalto que virou crônica e depois virou brincadeira.
Por ser essa segunda especial, uma marca na minha vida.
Bom dia minha gente!!
Abração, Marconi
Eu já havia iniciado esta crônica e nem imaginaria que iria haver uma exemplo mais pronto e mais recente para ilustrar a minha percepção: a invasão do Senado dos Estados Unidos, nesta quarta-feira, pelos apoiadores de Donald Trump, na tentativa de evitar a homologação da eleição de Joe Biden.
Muitos anos atrás cansei de ouvir: "Seguir a regra do jogo". Era isso mesmo, quem jogava segundo tais regras tendia a ser vencedor, independente de qualquer ética envolvida e menos ainda de qualquer princípio moral. Nesse grande anfiteatro que é a política, necessária, execrada, mal vista, mal afamada, de muita gente que vai pelos interesses pessoais, das corporações, as quais defende. Corporações entendida como empresas, classes profissionais, religiosas, facções. Tem de quase tudo ou tudo. O baixo clero tenta sobreviver nessa gameização e os que mandam de fato, nem aparecem. Mas tem o alto clero, dotados de grande poder de decisão. Mas tudo é um grande game.
E o povo em geral, fica, quando fica na arquibancada. Na gigantesca maioria, somos meros passageiros, à mercê de qualquer "motorista". Tem várias pessoas que falam de espírito republicano, a quem interessa isto?
Queremos o resultado, a sociedade deseja que a sua vida melhore. É por isso que a política existe, para equilibrar as forças. Mas não equilibra, os tais ideais republicanos somem no meio dessa gameização. Soa, para nós comuns, como um termo sem sentido, coisa de academia, de mestrado ou doutorado. Um termo que para virar prática e tornar a vida das pessoas melhores, tem que sair do ideal e ir para o dia a dia.
Parece com uberização? Tem o mesmo sentido. É um neologismo.
Tudo é um jogo. Há muito tempo.
E quando tudo é um jogo?
Aí vem a propaganda, os algoritmo sendo usados para nos incutir e desperta os nossos sentimentos mais ruins, regressivos: como rancor, ódio, mal querença, insatisfação, barriga vazia, falta de oportunidade, frustração. A culpa é do outro. Criando um efervescência que nos impede de ver a manipulação. É jogo, quer aceitemos ou não. A maioria de nós é pato nesse game. Só entra para perder.
Outro dia eu estava lendo sobre a corrupção em um livro sobre comportamento coletivo. Neste livro, já no final, o autor* se expressa mais ou menos assim: Aí vem o sistema e oferece uma vantagem, a pessoa recusa. Vem outro dia, e oferece outra vantagem. Muda o canto e abre uma brecha para a pessoa aceitar. Mais uma vez há a recusa. O sistema desta vez mistura o doce com o amargo, mistura a vantagem com uma perda. Ganho e perda no mesmo prato. Aí, a resistência é quebrada. A pessoa aceita ser Serva do sistema. Quem é o sistema? Melhor, o que é o sistema?
Pensou nisso: Quem é o sistema? O que é o sistema?
Vale para qualquer circunstância da vida em uma sociedade organizada. Muitas vezes, mesmo sem querer, as pessoas se transformam em "bois de piranha". O bode expiatório, o besta que se fode. É jogo.
Ruim é reconhecer que viramos peão do jogo do outro. Quando cremos, piamente, que fizemos o melhor e apenas somos uma mera engrenagem. Terrível.
Às vezes, muitas, na verdade, nada se pode fazer isoladamente, por isso ter sindicatos fortes, entidades da sociedade civil fortes, ONG fortes, movimentos civis atuantes. A questão esbarra, que para isso ocorrer se precisa de recurso. Estrangule a fonte de dinheiro e tudo isso se enfraquece. Não é a toa que a força policial vai em cima dos recursos das gangues internacionais, é para matá-las por falta de dinheiro. Por exemplo: o Imposto Sindical tinha muito mal uso, e agora? Alguém já ponderou o que vem ocorrendo com a defesa sindical para as categorias profissionais?
Todas foram cooptadas por não terem fonte de receitas. Os trabalhadores do Brasil não aderem fácil às entidades de classe. É uma realidade a se tentar alterar.
Isto que ocorreu, esse sufocamento financeiro, não foi uma jogada magistral?
É importante entender e se perguntar constantemente: A quem interessa algo que aparece na redes sociais, mídias, na boca das pessoas? Quem vai ganhar com isso? A quem interessa o incitamento que ocorreu nos Estados Unidos? A quem interessa incitar comportamento radicais?
Feito isto, vamos viver.
Semana Iluminada.
(*)
Autor: Philip Zumbardo.
imagem: Orlando/UOL. Um papo na última segunda-feira entre aposentados do Banco do Brasil que tiveram poder concedido pela empr...